Vitorioso, Doria prega união no PSDB e com aliados contra Lula e Bolsonaro

Bolsonaro, claro, é um dos alvos preferenciais de Dória no discurso

Vitorioso nas prévias presidenciais do PSDB, o governador João Doria (SP) faz um discurso em que prega a união de seu partido e de outras siglas em torno de um projeto liberal para enfrentar Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (sem partido, rumo ao PL).

A Folha teve acesso ao texto que Doria fará neste sábado (27), após derrotar o governador Eduardo Leite (RS) e o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio, na disputa interna que quase desandou devido a problemas técnicos no domingo passado (21). O paulista teve 53,99% dos 30 mil votos na prévia, ante 44,66% do gaúcho e 1,35% do manauara.

Na fala, Doria acena a seus rivais, particularmente Leite, com quem travou uma amarga disputa ao longo das prévias –Virgílio, que nunca teve chances, trabalhou em dobradinha com o paulista, embora tenha reservado críticas ao que chama de falta de traquejo político do colega.

“A eleição foi linda. Não tenho dúvidas de que foi difícil a decisão. Eduardo Leite e Arthur Virgílio são meus amigos e do mesmo partido. A partir de agora, fazemos parte da mesma chapa”, diz o texto.
Doria fala à sua plateia, o militante do PSDB, e homenageia em sequência líderes históricos do partido: o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, os ex-governadores paulistas Mário Covas, Franco Montoro e José Serra.

Surpreendentemente, sobra deferência até a um desafeto, Geraldo Alckmin, elogiado pontualmente por suas “escolas técnicas”. O ex-governador paulista está de saída do PSDB, provavelmente para o PSD, para tentar voltar ao cargo que ocupou em quatro ocasiões.

Alckmin se credenciou para votar nas prévias, na qualidade de ex-presidente do partido, integrando um grupo com grande peso proporcional no certame. Foi duramente criticado nos bastidores por aliados de Doria por isso.
Mais do que pregar a união do PSDB, de saída uma missão quase impossível dada a animosidade entre seu grupo e o liderado por Aécio Neves (MG), que apadrinhou Leite, Doria já acena aos aliados que quer convencer a trabalhar juntos na chamada terceira via.

“Ninguém faz nada sozinho. Precisaremos da ajuda de todos. Da união do Brasil. Da união do PSDB. Da união com outros líderes e partidos”, diz o texto. Leite era visto por parceiros potenciais em 2022 como um nome mais agregador, até porque tem menos densidade política por ser jovem (36 anos) e governar um estado menor do que São Paulo.
De resto, o discurso é um compêndio das bases da campanha de Doria, se de fato se viabilizar como candidato no ano que vem.

Ele desfia números positivos da economia e fala sobre programas sociais de sua gestão. Lembra que “trouxemos a vacina para os brasileiros, vacina negligenciada pelo governo federal mas que salvou milhões de vidas”, em referência à sua batalha contra Bolsonaro para fabricar e distribuir a Coronavac. Como o pânico pelo surgimento da variante ômicron sugere, a economia pode ser o tema dominante da campanha de 2022, mas a pandemia não estará exatamente no retrovisor.

Bolsonaro, claro, é um dos alvos preferenciais de Doria no discurso. Ele já faz seu “hedge” antecipando a usual crítica pelo associação com o hoje presidente no segundo turno de 2018. “Bolsonaro vendeu um sonho e entregou um pesadelo”, diz o texto, falando sobre a erosão institucional nesses quase três anos de governo.

Sobra também para o PT. “Os governos Lula e Dilma representaram a captura do estado pelo maior esquema de corrupção do qual se tem notícia no país. A moralidade convertida em roubalheira. Fazer políticas públicas para os mais pobres não dá direito, a quem quer que seja, de roubar o dinheiro público.”

Aqui a consonância é com Sergio Moro, o ex-juiz símbolo da Lava Jato que se lançou como candidato a presidente. No grupo de Doria, não é segredo o desejo de ver ambos unidos em 2022 –com o tucano à frente.
Doria embarca na terça (30) para Nova York, onde lidera uma missão empresarial. O discurso para os investidores quem quem irá se encontrar está pronto.

Ele repete a promessa de fazer um governo liberal, com ênfase em privatizações, concessões, investimento em infraestrutura e responsabilidade fiscal. Ao mesmo tempo, promete aumento de emprego e renda, e reformas “não para gerar superávit primário, mas para gerar inclusão”.

“Vamos reconstruir o Brasil. Há milhões de brasileiros vivendo na miséria. E é para eles que temos de olhar primeiro. Com programas de transferência de renda, sem furar o teto de gastos, ensino integral para as crianças, atendimento de saúde às famílias mais pobres e programas de geração de emprego”, disse.

Por fim, completando o padrão ESG (a sigla inglesa para ambiente, social e governança, mantra do bom-mocismo empresarial atual) de qualquer discurso público nesses dias, referências à preservação do ambiente, da economia de baixo carbono, da ciência –sem, claro, esquecer de acenar ao agronegócio (que é “aliado do meio ambiente”).

Por Igor Gielow

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