Pena de demissão por outdoor da Lava Jato é desproporcional, dizem procuradores e defesa
Castor de Mattos foi membro da antiga força-tarefa de Curitiba
A decisão do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) de aplicar a pena de demissão ao procurador que bancou em Curitiba um outdoor em homenagem à Operação da Lava Jato tem sido considerada desproporcional por colegas de Diogo Castor de Mattos e sua própria defesa, que tentará reverter a situação.
Apesar disso, há um entendimento de que não é o momento de enfrentar o conselho em meio à votação de uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que altera a sua composição e, na prática, dá mais poder ao Congresso no colegiado.
Castor de Mattos foi membro da antiga força-tarefa de Curitiba e cedeu recursos para a propaganda colocada na saída do aeroporto da capital paranaense no início de 2019, por ocasião dos cinco anos da investigação.
“Bem-vindo a República de Curitiba. Terra da Operação Lava Jato, a investigação que mudou o país. Aqui a Lei se cumpre”, afirmava o outdoor.
Por 6 votos a 5, o plenário do CNMP entendeu nesta segunda-feira (18) que o procurador cometeu ato de improbidade administrativa. Segundo o entendimento, a infração impõe a pena de demissão.
Para que haja demissão, no entanto, o procurador-geral da República, Augusto Aras, ainda precisa designar um procurador para ajuizar ação de perda de cargo.
“Não é que a situação não tenha ocorrido nem que não seja grave. Mas não é grave o suficiente para uma demissão”, afirma o presidente da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), Ubiratan Cazetta.
“A dimensão [do fato] não é proporcional ao tamanho da pena. Isso causa um mal muito grande quando entra no casuísmo, por ele estar vinculado à legenda da Lava Jato. Não é um sinal de funcionamento do sistema, mas de disfuncionamento”, afirma Cazetta.
No processo, Castor de Mattos afirmou que à época estava com problemas de natureza psiquiátrica, que resultaram no seu afastamento das atividades.
Para ele, era injusto os ataques contra os trabalhos desenvolvidos pela força-tarefa e uma pessoa que integrava movimento de apoio à operação o procurou para financiar uma divulgação para “elogiar e levantar o ‘moral’ do grupo”. Ele pagou pela divulgação, com recursos próprios, cerca de R$ 4.000.
O procurador não afirmou ter contratado a publicidade em seus modelos finais, mas apenas bancado com os seus recursos.
A defesa dele tem frisado que o dinheiro doado foi privado, que a contratação do outdoor foi feita por terceiros e que Castor de Mattos nunca foi punido antes pelo CNMP, e, portanto, ele deveria ter uma punição mais branda, como suspensão.
“Diogo Castor nunca esteve em julgamento, quem esteve em julgamento é a Operação Lava Jato. Diogo usou recursos privados e fez doação a uma pessoa da sociedade civil, e isso não constitui improbidade administrativa”, afirma Alexandre Vitorino Silva, seu advogado.
As opções para Castor de Mattos passam agora por recursos que ele pode apresentar no próprio CNMP e também ao STF (Supremo Tribunal Federal).
Uma das possibilidades da defesa é aguardar a sanção pelo presidente Jair Bolsonaro da nova lei de improbidade administrativa, que menciona proibição a autopromoções que usem “recursos do erário”.
Para a defesa, há entendimentos de tribunais superiores de que essa nova lei pode ser considerada retroativa, por ser mais benéfica a acusados.
A decisão do CNMP contra Castor de Mattos gerou reações tímidas de procuradores nas redes sociais, que estão concentrados em campanha contra a aprovação da PEC no Congresso. A previsão é a de que ela seja votada ainda nesta terça (19) no plenário da Câmara.
Alguns deles também trataram a decisão do conselho como desproporcional. Deltan Dallagnol, que coordenou a força-tarefa de Curitiba, não mencionou o caso em suas publicações no Twitter e no Instagram.
Especialista em direito público consultada pela reportagem também vê desproporcionalidade na decisão do conselho, à véspera da votação da PEC.
Segundo Vera Chemim, advogada constitucionalista e mestre em direito público pela FGV, outros casos mais graves não foram punidos com o mesmo rigor.
“Trata-se de uma questão de bom senso e equilíbrio que foi substituída pelo afã de escolher aquele procurador, como forma de dar o exemplo oportuno e conveniente de sua imparcialidade e apreço aos dispositivos constitucionais e à legislação existente sobre o tema”, afirma.
Segundo ela, existem divergências de entendimento se uma eventual demissão de Castor de Mattos também irá fazer com que ele perca a aposentadoria.
No CNMP, o corregedor nacional Rinaldo Reis Lima e o conselheiro Sílvio Amorim Júnior propuseram a conversão da pena em suspensão -o primeiro sugeriu 90 dias, e o segundo, 16. Contudo foram vencidos na discussão sobre a possibilidade de aplicação dessa pena.
O conselheiro Amorim Júnior afirmou que considerava atenuantes o fato de o procurador sofrer, à época dos fatos, de grave quadro depressivo, além de ter admitido o pagamento pelo outdoor.
A conselheira Fernanda Santos, relatora do caso, entendeu, porém, que a norma não permitiria a conversão da pena em casos em que o cometimento de improbidade administrativa foi reconhecido.
“Entendo que o ato foi grave pelos danos ao Ministério Público como um todo”, afirmou ela.