Onyx dispensa pareceres e afasta técnicos em medidas polêmicas do Trabalho
O ministro ignorou o posicionamento de especialistas da pasta em decisões polêmicas e restringiu o alcance da atuação deles
O ministro do Trabalho e da Previdência, Onyx Lorenzoni, escanteou técnicos e dispensou a elaboração de pareceres para a tomada de decisões na pasta, recriada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) para abrigá-lo.
O método foi usado em uma das medidas mais controversas de Onyx até agora: a proibição, em uma canetada, de que empresas exijam vacinação de funcionários no ato da contratação.
A portaria do ministro também vedou a possibilidade de demissão em caso de recusa de imunização contra Covid-19 por parte do empregado.
O ato de Onyx, de 1º de novembro de 2021, esteve alinhado à postura de Bolsonaro, que usa a Presidência e faz campanha em desfavor da vacinação contra a Covid-19.
No dia 12 daquele mês, o ministro Luís Roberto Barroso, do STF (Supremo Tribunal Federal), derrubou trechos da portaria que blindavam os antivacinas nas empresas.
Respostas do Ministério do Trabalho e da Previdência ao jornal Folha de S.Paulo, em um pedido feito via LAI (Lei de Acesso à Informação), indicam que Onyx dispensou a constituição de um processo, a adoção de um rito técnico e a elaboração de pareceres para baixar a portaria.
A reportagem pediu uma cópia do processo que embasou o ato, o que foi negado por três vezes, em sucessivos recursos.
Em vez de fornecer o processo, a pasta afirmou que a portaria foi baseada apenas em “análise técnica” do ministério, com auxílio do Ministério da Saúde; em normas do STF e do TST (Tribunal Superior do Trabalho) sobre circulação em seus respectivos prédios durante a pandemia; e no que prevê a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).
Depois, a pasta também citou como base para a portaria “atos normativos de direito comparado, conforme estabelecido pela União Europeia”.
O ministério de Onyx buscou em normas internas do STF e do TST razões para proibir decisões empresariais relacionadas a imunização durante uma pandemia. O ministério critica o que chama de “vacinação forçada”.
“[As normas de STF e TST] Garantem, para o fim de acesso e circulação nas dependências dos mencionados tribunais, a alternatividade de medidas para comprovar a inexistência de risco à coletividade no caso da não vacinação, tais como apresentação de testes RT-PCR ou de antígenos não reagentes para a doença feitos nas últimas 72 horas”, afirmou o ministério, na resposta via LAI.
Segundo a pasta, isso já garantiria “a salvaguarda e vida das pessoas, mas de modo a preservar o direito individual do cidadão de não ser submetido à vacinação forçada”.
Menos de um mês depois da edição da portaria, Onyx assinou um novo ato que restringe a possibilidade de orientações, recomendações e diretrizes por equipes técnicas de fiscalização do trabalho, o que foi visto por técnicos da pasta ouvidos pela reportagem como uma forma de censura e de limitação das ações de auditoria.
A portaria de Onyx afirma: “Às unidades vinculadas à Secretaria de Trabalho é vedado emitir instruções ou orientações por meio de instrumentos diversos dos previstos nesta portaria, tais como precedentes administrativos, notas técnicas, notas informativas, ofícios circulares, recomendações, diretrizes ou congêneres.”
Se a medida já valesse, teria sido impossível expedir orientações sobre medidas de segurança e saúde no trabalho durante a pandemia; orientar fiscalizações do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço); e estabelecer medidas para reforçar a segurança de auditores fiscais do trabalho, diante de agressões sofridas.
Essas questões foram objeto de atos de equipes técnicas cuja atuação passou a ser restringida com a portaria de Onyx, conforme auditores ouvidos pela reportagem sob a condição de anonimato.
O ato também proíbe que Superintendências Regionais do Trabalho e unidades vinculadas a elas emitam portarias, instruções normativas e orientações técnicas. Ficaram vedados ainda acordos de cooperação, convênios e protocolos de intenção a cargo das superintendências.
O Ministério do Trabalho não respondeu aos questionamentos da reportagem.
No começo do governo, Bolsonaro extinguiu o ministério e o converteu em órgãos do Ministério da Economia, sob o comando de Paulo Guedes. O discurso do presidente era de enxugamento da máquina pública.
Em julho de 2021, Bolsonaro recriou a pasta para abrigar Onyx na Esplanada dos Ministérios.
O aliado perdeu o posto que ocupava no Palácio do Planalto, em uma reforma feita pelo presidente para ampliar o espaço do centrão. Em três anos, Onyx já foi ministro da Casa Civil, da Cidadania, da Secretaria-Geral da Presidência e agora do Trabalho e da Previdência.
Sua gestão no Trabalho e na Previdência passou a barrar bens, serviços e dinheiro acertados com infratores que firmam TACs (termos de ajustamento de conduta) com o MPT (Ministério Público do Trabalho), o que enfraquece a fiscalização trabalhista, dada a dependência de unidades regionais a esses recursos para conseguirem funcionar, como a Folha de S.Paulo mostrou em 11 de novembro.
Unidades regionais dependem desses recursos para funcionar, e o ministério definiu que os recursos devem ser destinados ao FDD (Fundo de Defesa dos Direitos Difusos) ou ao FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador).
A nova orientação destoa do que é praticado, por exemplo, por Polícia Federal e PRF (Polícia Rodoviária Federal), vinculadas ao Ministério da Justiça e Segurança Pública. As polícias seguem recebendo esses recursos e bens.
A gestão do ministro também já retirou do ar balanço de fiscalização de infrações do trabalho e buscou não dar visibilidade ao atendimento a mais de cem trabalhadores resgatados de trabalho escravo no entorno de Brasília.
Os acertos foram conduzidos em um anexo do ministério na capital federal, e não no prédio principal, após orientação de integrantes da cúpula da pasta.
Por Vinicius Sassine