Lobista não aparece para depor, e CPI aciona polícia legislativa para ‘condução sob vara’

Requerimento também prevê que ele não poderá deixar a comarca

Após o não comparecimento do lobista Marconny Albernaz de Faria, que prestaria depoimento nesta quinta-feira (2), a CPI da Covid aprovou requerimento para requerer ao Supremo Tribunal Federal a condução coercitiva e a apreensão do passaporte do depoente, por um período de 30 dias.

O requerimento aprovado também prevê que Marconny não pode deixar a comarca em que reside sem a prévia autorização da CPI.
Por causa da ausência de Marconny, a CPI decidiu realizar ainda nesta quinta-feira o depoimento do ex-secretário de Saúde do Distrito Federal Francisco de Araújo Filho, que recentemente foi preso acusado de corrupção.

Inicialmente, a cúpula da comissão havia determinado para a polícia legislativa a ‘condução sob vara’ de Marconny. No entanto, após a reação de governistas, que apontaram que a ação configuraria abuso de poder, a cúpula decidiu recorrer ao STF, solicitando a condução coercitiva.

O vice-presidente Randolfe Rodrigues (Rede-AP) também havia levantado a hipótese de pedir a prisão preventiva do lobista, mas houve resistência entre os demais membros do colegiado.

Ao chegar para a sessão, Randolfe havia afirmado que a polícia legislativa já havia sido acionada para colocar em prática a condução sob vara de Marconny, instrumento jurídico semelhante à condução coercitiva, mas que é prerrogativa de uma comissão parlamentar de inquérito. Segundo o senador, não é necessária autorização judicial.

“A direção da Comissão Parlamentar de Inquérito já determinou a condução sob vara. Nós estamos a partir de agora procurando a localização dele, em alguns endereços aqui de Brasília. Caso a gente não consiga localizá-lo para conduzi-lo ao depoimento ainda no dia de hoje, irei requisitar a prisão preventiva”, afirmou o vice-presidente da comissão.

Marconny conta com um habeas corpus concedido pela ministra Carmen Lúcia, que garantiu seu direito ao silêncio durante o depoimento. No entanto, não permitiu sua ausência na oitiva.

Randolfe também havia dito que encaminharia para a CPI um pedido de requisição para a justiça de 1ª instância de prisão preventiva, caso Marconny não seja localizado. Também afirmou que vai pedir a notificação da Interpol, pois desconfia que ele possa ter deixado o país.

“Se ele não for localizado, então ele passa a ser foragido e até em decorrência disso, por isso vamos pedir de imediato a prisão preventiva e a comunicação da Interpol para uma eventual evasão dele do território nacional “, afirmou Randolfe.

Marconny é apontado como lobista da Precisa Medicamentos e de outras empresas. Ele aparece em diálogos tratando da venda de testes para detectar a Covid-19.
O advogado de Marconny, William de Araújo Falcomer, que também não foi localizado pela CPI, auxiliou na abertura do registro da empresa de Jair Renan Bolsonaro, a Bolsonaro Jr Eventos e Mídia, conforme revelou o jornal Folha de S.Paulo nesta quarta-feira. A ajuda foi dada após Marconny solicitar ao advogado que recebesse o filho do presidente para ele o auxiliasse.

As informações constam de conversas no WhatsApp obtidas pela Folha de S.Paulo entre o lobista e Renan, após quebra judicial de sigilo do lobista a pedido do Ministério Público Federal do Pará, e de análise de documentos da Receita Federal.

Os diálogos foram enviados à CPI pela Procuradoria, depois que os investigadores daquele estado, que apuravam a influência do lobista em uma indicação para órgão público, viram que Marconny havia sido citado nas negociações da Precisa Medicamentos.

O telefone registrado no cadastro da Receita Federal como sendo da Bolsonaro Jr Eventos é o mesmo contato do escritório de William de Araújo Falcomer dos Santos. Nesta terça-feira (31), a Folha de S.Paulo ligou para o local e a secretária confirmou que se tratava do escritório de William, mas que o advogado estava em viagem.

Ele não respondeu os contatos feitos pela Folha de S.Paulo por telefone, celular, emails e mensagens no WhatsApp, assim como Marconny e a Precisa Medicamentos também não se pronunciaram.
Randolfe Rodrigues descreveu Marconny como o “senhor de todos os lobbies” e relembrou a reportagem publicada pela Folha de S.Paulo.

“Temos um material probatório vastíssimo. Esse senhor não é um lobista somente da Precisa. Esse é o senhor de todos os lobies. Esse senhor está presente em esquemas, sobretudo no Ministério da Saúde, desde o ano passado ou antes. Então não se trata apenas de uma farmacêutica. Ele é o senhor de todos os lobbies, sobretudo no Ministério da Saúde, e com diálogos com pessoas próximas do presidente da República e contatos com pessoas próximas do presidente da República”, afirmou.

O vice-presidente da comissão ainda afirmou que não descarta a convocação de Jair Renan Bolsonaro para explicar a sua ligação com o lobista.
Antes do início da oitiva de Francisco de Araújo Filho, os senadores da comissão realizaram uma sessão secreta para ouvir áudios de conversa envolvendo o lobista. O relator Renan Calheiros (MDB-AL) chegou a veicular esses áudios durante a sessão aberta, mas foi alertado de que eles fazem parte de um inquérito sigiloso.

Marconny chegou a enviar um atestado médico para a comissão, alegando que estava com dores pélvicas. O documento previa um afastamento das suas atividades por até 20 dias.
A cúpula da comissão desconfiou da versão.

“Se um trabalhador brasileiro tiver o que o doutor Marconny teve, duvido ele conseguir 20 dias para ficar em casa com uma dor pélvica”, afirmou o presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM).
Randolfe depois informou que manteve contato com o médico, que levantou dúvidas sobre a real situação do paciente, e por isso o depoimento foi confirmado para esta quinta-feira.

“O médico que concedeu o atestado do senhor Marconny Faria, entrou em contato conosco e disse que foi ele que concedeu o atestado, mas que notou uma simulação por parte do paciente e que deseja cancelar o mesmo. Com isso, amanhã receberemos o Sr. Marconny na CPI da Covid”, escreveu em suas redes sociais.

Texto: Renato Machado e Constança Rezende

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