Igreja Presbiteriana é pressionada, mas adota silêncio e decide não afastar Milton Ribeiro
IPB é pressionada nas redes sociais e por igrejas a se manifestar sobre o caso, enquanto os integrantes da cúpula da instituição divergem
Às 20h13 de quarta-feira (22), o presbítero Antônio César de Araújo Freitas enviou uma mensagem num grupo de WhatsApp a colegas da IPB (Igreja Presbiteriana do Brasil).
“Meus irmãos, estive com o Reverendo Milton [Ribeiro], na Superintendência da Polícia Federal em São Paulo, agora no início da noite, conversamos um pouco, orei com ele e deixei um abraço dizendo que seus irmãos estão em oração.”
“Maravilha, César. Oremos por ele”, respondeu o chanceler do Mackenzie, Robinson Grangeiro.
A conversa de Antônio com Milton durou cerca de dez minutos na sala em que o ex-ministro ficou detido por um dia, segundo relatos feitos à reportagem por interlocutores do presbítero.
A visita servia para mostrar apoio ao amigo, ex-ministro e pastor presbiteriano, que foi preso preventivamente por suspeita de ter cometido os crimes de corrupção passiva, tráfico de influência, prevaricação e advocacia administrativa.
No dia seguinte, Ribeiro foi solto por ordem do TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região).
Antônio César é vice-presidente do Conselho de Administração do Instituto Prebisteriano Mackenzie. Ele conseguiu visitar Milton por ser advogado, mesmo sem defender o ex-ministro em nenhum processo.
“Fui fazer uma visita de cortesia na condição de amigo”, limitou-se a dizer à reportagem, acrescentando que não tem autorização para dar detalhes da conversa.
A prisão de Milton desencadeou a maior crise na Igreja Presbiteriana do Brasil em décadas, segundo seus integrantes. A IPB é pressionada nas redes sociais e por igrejas a se manifestar sobre o caso, enquanto os integrantes da cúpula da instituição divergem em discussões sobre a postura que deve ser adotada.
O presidente do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil, Roberto Brasileiro, no entanto, pediu para os membros dos altos cargos da instituição manterem silêncio e esperarem os desdobramentos da investigação da PF (Polícia Federal).
A reportagem conversou com 11 integrantes e interlocutores da alta cúpula da Igreja Presbiteriana do Brasil nos últimos três dias.
O caso Milton foi o principal tema na reunião bimestral do Conselho de Administração do Mackenzie, na quinta (23). No início do encontro, segundo relatos, Roberto Brasileiro pediu para os conselheiros ficarem como “passarinho na muda”, uma expressão que significa manter-se em silêncio.
Brasileiro ainda disse que Milton, ex-vice-reitor do Mackenzie, não será afastado pela cúpula da igreja e que a instituição não fará nenhuma manifestação pública sobre o assunto.
Segundo integrantes do colegiado, o presbítero Antônio César disse na reunião que, durante a visita de quarta, Milton falou que suas mãos estavam limpas e que a investigação da PF irá comprovar a sua inocência.
As avaliações feitas pelos membros da cúpula da IPB à reportagem são diversas. A maioria acredita que Milton foi ingênuo ao abrir as portas do Ministério da Educação aos pastores pentecostais Gilmar Santos e Arilton Moura. Segundo eles, esses pastores usaram o ex-ministro para pedir propina.
Outros acreditam que Milton tem culpa por ter misturado o cargo público com a vocação pastoral e eliminado critérios técnicos para a distribuição de recursos do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação).
A postura do presidente Jair Bolsonaro (PL), que deixou de defender a inocência do ex-ministro, também foi considerada decepcionante por membros da Igreja Presbiteriana.
Roberto Brasileiro está em seu quinto mandato e segue desde 2002 no mais alto posto da IPB. Religiosos e aliados o descrevem como um pastor conciliador, com interlocução com todas as alas da igreja presbiteriana.
Um dos filhos dele, Gustavo Brasileiro, foi assessor especial de Milton Ribeiro no Ministério da Educação. Ele pediu exoneração em 1º de abril, na mesma semana em que o ministro deixou o governo. Gustavo é pré-candidato pelo Novo para o cargo de deputado estadual por Minas Gerais.
A reportagem enviou mensagens para Roberto Brasileiro, mas ele não se manifestou.
A Igreja Presbiteriana do Brasil tem 162 anos e, durante sua história, desenvolveu uma estrutura organizada. As igrejas de determinada região compõem um Presbitério. O conjunto de presbitérios de uma cidade ou estado forma um Sínodo. Acima dele está o Supremo Concílio.
A Igreja Presbiteriana Jardim de Oração, cujo pastor é Milton Ribeiro, faz parte do Presbitério de Santos -também presidido pelo ex-ministro. Qualquer processo contra o pastor dentro da IPB deve ser inicialmente apurado por essa instância.
O vice-presidente do Presbitério de Santos, pastor Vulmar Dutra, não vê na prisão de Milton motivo para a abertura de um processo interno contra o ex-ministro.
“[Qualquer processo] só será aberto se ele for julgado [pelo Judiciário] ou se houver alguma denúncia formal. Do contrário, vamos continuar. Esse é o trâmite da igreja. Não há nada, nenhuma denúncia formal. A gente não julga ninguém por presunção”, disse à reportagem.
“A gente ora para que tudo se esgote o mais rápido possível e não vá nada à frente, que ele consiga se defender. Essa é a nossa esperança”, completou.
A reunião anual do Supremo Concílio está prevista para o fim de julho, em Cuiabá (MT). A expectativa da cúpula da IPB é ignorar o caso Milton nas discussões, mas há receio de que alguém levante o assunto durante o encontro.
Milton Ribeiro foi preso na quarta com os pastores Arilton Moura e Gilmar Santos por suspeita de operar um balcão de negócios no Ministério da Educação e na liberação de verbas do FNDE.
O ex-ministro saiu da prisão após conseguir um habeas corpus do juiz federal Ney Bello, do TRF-1, na quinta (23).
Nesta sexta-feira (24), a Justiça Federal do Distrito Federal encaminhou o caso ao STF (Supremo Tribunal Federal), indicando suspeitas de interferência de Bolsonaro nas apurações.
A operação foi batizada de Acesso Pago e, segundo a PF, investiga a prática de “tráfico de influência e corrupção para a liberação de recursos públicos” do FNDE.
A suspeita é que os pastores Gilmar e Arilton negociavam com prefeituras a liberação de recursos do Ministério da Educação mesmo sem ter cargos no governo. Em troca, prefeitos disseram ter recebido pedidos de propina da dupla.
Em áudio revelado pela Folha de S.Paulo, Milton Ribeiro disse que priorizava pedidos dos amigos de um dos pastores a pedido de Bolsonaro.
Na gravação, o então ministro ainda mencionava pedidos de apoio que seriam supostamente direcionados para a construção de igrejas. A atuação dos pastores junto ao MEC foi revelada anteriormente pelo jornal O Estado de S. Paulo.
Por César Feitoza