Desembargadora que firmou acordo inédito de delação tem prisão revogada pelo STJ
Magistrada, que está afastada do Tribunal de Justiça da Bahia, foi presa em março do ano passado
O ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Og Fernandes, relator da Operação Faroeste, revogou a prisão domiciliar de Sandra Inês Rusciolelli, primeira desembargadora a firmar um acordo de delação premiada do Brasil.
A magistrada, que está afastada do Tribunal de Justiça da Bahia, foi presa em março do ano passado e, seis meses depois, transferida para sua residência.
À época, ela estava negociando uma colaboração que, como revelou a Folha, menciona dezenas de magistrados, advogados e empresários.
Og Fernandes também revogou a prisão do advogado Vasco Rusciolelli, filho de Sandra Inês, que também firmou colaboração e estava em domiciliar.
A decisão, porém, mantém os dois com tornozeleira eletrônica.
Og Fernandes também determinou que mãe e filho não acessem as dependências do Tribunal de Justiça da Bahia, não se comuniquem com outros investigados da Faroeste (a não ser entre si, mãe e filho) ou com funcionários da corte e não saiam de Salvador.
Segundo o ministro, a prisão foi revogada devido ao tempo em que os dois estavam presos e porque eles têm demonstrado postura colaborativa para as investigações.
O advogado da desembargadora, Pedro Henrique Duarte, chegou a pedir que as tornozeleiras fossem retiradas, sob o argumento de que o monitoramento vinha causando transtornos psicológicos aos dois.
“[Eles se] veem com sirenes alarmando nas tornozeleiras, notadamente, à noite, ou em véspera de fins de semana, impedindo o descanso noturno deles e dos respectivos cônjuges”, disse o advogado, em pedido transcrito na decisão.
O ministro, porém, negou a solicitação.
A Faroeste é a maior operação sobre vendas de decisões judiciais do Brasil. A desembargadora havia sido presa após uma ação controlada da Polícia Federal identificar o pagamento de R$ 250 mil ao filho para que ela desse um despacho favorável a uma empresa.
Mãe e filho foram denunciados sob acusação da prática dos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro e de integrar organização criminosa, mas o processo está suspenso e a denúncia ainda não foi aceita.
A colaboração de Sandra Inês tem 39 anexos ao todo. Entre os citados, estão 12 desembargadores do TJ-BA (incluindo uma aposentada) e 12 juízes. Três desses desembargadores ainda não haviam sido citados anteriormente na investigação.
Além disso, são mencionados 15 advogados e 16 funcionários do TJ-BA. Há ainda mais de uma dezena de filhos e parentes de magistrados e de investigados que participaram, segundo a delação, de alguma das situações relatadas na colaboração.
Os delatores também citam políticos, empresários e agentes públicos como o ex-secretário de Segurança Pública da Bahia, o delegado da Polícia Federal Maurício Teles Barbosa, também investigado na Faroeste. Ele nega ter cometido irregularidades.
Antes de Sandra Inês, outras desembargadoras que estavam presas no âmbito da operação também foram soltas, sob medidas cautelares.
Na última semana, Og Fernandes também revogou a prisão de outro investigado na Faroeste, o empresário Adailton Maturino, que ficou conhecido como “falso cônsul”. No entanto, ele não foi solto porque ainda tem uma prisão preventiva em vigência, relacionada a outra operação.
Maturino se apresentava como cônsul honorário da Guiné-Bissau, embora não tivesse autorização do Itamaraty para representar o país no Brasil. Ele era conhecido pelo seu bom trânsito na alta cúpula dos Poderes da Bahia e do Piauí.
De acordo com as investigações, pagou para obter decisões favoráveis de desembargadores em benefício de José Valter Dias -na descrição do Ministério Público, um homem que era um borracheiro e virou um latifundiário.
Com as decisões, Dias pôde se tornar o dono de 360 mil hectares da Fazenda São José, em Formosa do Rio Preto, região de cerrado baiano na divisa com o Piauí. Tanto Maturino como José Valter Dias negam as acusações.
“A decisão do Ministro Og Fernandes, que revogou a prisão preventiva de Adailton Maturino após 702 dias, só corrobora com o que a defesa vem arguindo desde o início da Operação Faroeste: a prisão de Adailton nunca foi necessária”, disse, em nota, José Eduardo Cardozo, ex-ministro da Justiça que é advogado de Maturino.
“A defesa confia e trabalha para que, em breve, Adailton esteja em liberdade para continuar a provar sua inocência.”