Aliados e ministros de Bolsonaro se dividem entre silêncio, golpismo e respeito à eleição
Com as tratativas da PEC da Transição, bolsonaristas já se mostram como oposição antes mesmo da posse de Lula
Face ao silêncio do presidente Jair Bolsonaro (PL), seus principais aliados e ministros têm adotado posturas distintas em relação ao resultado do pleito e ao governo de transição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Os integrantes da parte mais radical do bolsonarismo aderiram ao golpismo e seguem levantando dúvidas sobre a lisura das eleições e apoiando as manifestações antidemocráticas. A ala política do governo, composta principalmente por partidos do centrão, adotou posições mais legalistas e tem pregado respeito às instituições.
A ala menos conformada com a derrota tem defendido que o PL peça até a anulação da disputa, por vias jurídicas.
“As últimas informações dão conta de que o pedido de anulação das eleições não será feito ainda pelo PL. O prazo vai até dezembro e a versão do relatório ainda não é a definitiva. Vamos aguardar um pouco mais. Um relatório que aponte inconsistências graves não poderá fugir a seu destino”, disse a deputada Bia Kicis (PL-DF).
No último dia 2, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) e o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) publicaram vídeo de manifestação antidemocrática contra o resultado das eleições.
No caso de Eduardo, foi acompanhado de uma frase em que seu pai, o presidente Bolsonaro, diz que foi vítima de “injustiça” no pleito deste ano.
Dias depois, durante o feriado de 15 de novembro, o deputado publicou novamente um vídeo de manifestações e encerrou seu texto com a frase “não parar, não precipitar, não retroceder”.
O senador disse: “Aplausos de pé a todos os brasileiros que estão nas ruas protestando, espontaneamente, contra a falência moral do nosso país! Confiem no Capitão!”.
Do lado dos militares, a manifestação mais impactante em defesa dos protestos antidemocráticos partiu do ex-comandante do Exército general Eduardo Villas Bôas. O militar disse que os atos eram contra “atentados à democracia” e relacionados com “dúvidas sobre o processo eleitoral”.
O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, se equilibra entre defender o chefe do Executivo e buscar ministros do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para dizer que acredita no sistema eleitoral.
O partido é a maior bancada da Câmara, com 99 deputados, e já anunciou que estará na oposição. Valdemar tergiversou ao ser questionado sobre a derrota, condicionando-a ao relatório da Defesa.
O documento foi divulgado, depois, e não apontou nenhuma fraude no processo eleitoral.
Os que aderiram ao respeito do resultado eleitoral, em grande parte, são parlamentares ou governadores eleitos. Ratinho Jr (PSD-PR), por exemplo, apoiou Bolsonaro e se elegeu no primeiro turno, mas seu partido aderiu ao novo governo, sem resistências.
Ele deu, inclusive, aval ao movimento do PSD de aderir à gestão Lula.
A ex-ministra da Agricultura Tereza Cristina (PP-MS) disse que “é hora de seguir adiante”.
Nas discussões em torno da PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição, bolsonaristas já fazem oposição antes mesmo de Lula tomar posse.
A proposta abre espaço fora do teto de gastos para o pagamento do Bolsa Família no valor de R$ 600. O benefício nesse valor era uma das promessas do próprio Bolsonaro, embora não conste na proposta de orçamento encaminhada ao Congresso Nacional.
O deputado federal Filipe Barros (PL-PR) tem usado a expressão “cheque em branco”. Já Marco Feliciano (PL-SP) chamou a proposta de PEC da Gastança e da Irresponsabilidade.
No geral, o primeiro escalão de Bolsonaro adotou a reclusão, seguindo o estilo do presidente desde a derrota. Alguns chegaram a tirar uns dias de folga, outros visitaram-no, mas têm evitado declarações públicas.
Paulo Guedes, por exemplo, decidiu romper o vácuo de declarações em relação ao novo governo para criticar a forma como vem sendo negociada a PEC.
“Já ganhou, cala a boca, vai trabalhar, construir um negócio legal. O desafio é grande, mas a oportunidade é maior”, afirmou o titular da Economia durante evento de sua pasta.
Liderança do centrão e ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira anunciou até apoio à PEC da Transição, desde que retire o Bolsa Família do teto de gastos por apenas um ano.
Em outro momento, Nogueira também criticou o fato de o PT ter se colocado contrário à indicação de Ilan Goldfajn para a presidência do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento).
Apesar disso, em um gesto de reconhecimento do resultado das urnas, pouco depois de o TSE oficializar a derrota de Bolsonaro, Nogueira foi para a casa do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de onde acompanhou seu pronunciamento reconhecendo a vitória de Lula.
No dia, o ministro não deu declarações, mas publicou uma foto abraçando o mandatário, com a legenda: “Para sempre ao seu lado”.
Lira, por sua vez, fez questão de se encontrar com o presidente na véspera da sua reunião com o petista, ainda na primeira semana após o resultado. O seu reconhecimento às urnas, porém, foi contundente. Ele já ensaia adesão a Lula em troca do fortalecimento de sua candidatura à reeleição para a presidência da Câmara.