49% dizem que Bolsonaro fez menos do que poderia para investigar caso Bruno e Dom, segundo Datafolha
Para 18%, o governo fez o que poderia (nem a mais nem a menos); 6% dizem não saber opinar sobre a questão
O governo Jair Bolsonaro (PL) fez menos do que poderia para investigar os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips segundo a opinião de 49% dos brasileiros, mostra pesquisa Datafolha. O crime cometido neste mês na Amazônia evidenciou uma série de conflitos na região.
O levantamento, feito na quarta (22) e quinta-feira (23), revela ainda que 27% dos entrevistados pensam o inverso, ou seja, acreditam que o governo fez tudo o que poderia para ajudar a esclarecer o caso, que é apurado pela Polícia Federal e pela Polícia Civil do Amazonas em busca de eventuais mandantes.
Para 18%, o governo fez o que poderia (nem a mais nem a menos); 6% dizem não saber opinar sobre a questão.
O Datafolha ouviu 2.556 pessoas acima dos 16 anos em 181 cidades. A margem de erro da pesquisa, contratada pela Folha de S.Paulo e registrada no Tribunal Superior Eleitoral sob o número 09088/2022, é de dois pontos percentuais para mais ou menos.
As autoridades já prenderam três homens suspeitos pelas mortes. Foi a partir da confissão de culpa de um deles, o pescador Amarildo da Costa Oliveira, o Pelado, que a PF encontrou os corpos das vítimas, na região do Vale do Javari (AM).
A gestão Bolsonaro foi criticada não só por minimizar inicialmente a gravidade do episódio, mas também pela mobilização tímida nas buscas quando ainda se tratava de desaparecimento.
Entidades como o Alto Comissariado para Direitos Humanos da ONU, a embaixada do Reino Unido (país natal de Dom) e organizações da sociedade civil brasileira fizeram apelos por maior empenho. A Defensoria Pública da União chegou a ir à Justiça pedir o uso de helicópteros nos trabalhos.
O ministro Luís Roberto Barroso, do STF (Supremo Tribunal Federal), também cobrou respostas oficiais do governo sobre a estrutura utilizada na procura, atendendo a um pedido apresentado pela Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).
Bolsonaro evitou enquanto pôde se vincular ao caso, mas, instado a se manifestar, primeiramente deu declarações sugerindo já supor que o indigenista e o jornalista tinham sido mortos. Também transferiu a culpa para as vítimas, dizendo que elas estavam fazendo uma “aventura não recomendada”.
Cercado por críticas no Brasil e no exterior, o chefe do Executivo defendeu o governo cinco dias depois do sumiço. Durante viagem aos Estados Unidos para a Cúpula das Américas, disse que as Forças Armadas e a Polícia Federal estavam se destacando “na busca incansável para alcançar essas pessoas”.
Na mesma ocasião, o ministro da Justiça, Anderson Torres, disse a representantes do Reino Unido e dos EUA que ao menos R$ 500 mil já tinham sido gastos na investigação e nas buscas.
Após a confirmação das mortes, Torres afirmou ao jornal Folha de S.Paulo que houve um esforço “muito grande” dos investigadores e que eles fizeram um “trabalho espetacular” na região. “Queríamos ter encontrado os dois vivos”, disse, referindo-se ao crime como algo “cruel, uma maluquice”.
A pesquisa Datafolha mostrou ainda que o caso de Bruno e Dom ficou amplamente conhecido no país. Um total de 76% dos entrevistados diz ter conhecimento do episódio, sendo que 25% se consideram bem informados sobre ele. Já 24% das pessoas respondem que não souberam do ocorrido.
Abertamente contrário à demarcação de terras indígenas e à frente de um governo que enfraqueceu órgãos de fiscalização ambiental, Bolsonaro admitiu indiretamente a existência de criminalidade disseminada na região do Javari e admitiu a hipótese de influência dela nas mortes.
Em meio às buscas pelas duas vítimas, o presidente disse que Dom “era malvisto na região” porque fazia reportagens contra garimpeiros e sobre questões ambientais, mas não anunciou medidas para reduzir e fiscalizar os problemas que ele mesmo apontou serem objeto do trabalho do repórter.
Bolsonaro também rebateu a ordem de Barroso para a União tomar providências no caso. Chamou a decisão de dispensável e disse que o governo federal se empenhou desde o início para encontrar os dois.
Ele ainda ironizou a decisão do magistrado ao mencionar as “dezenas de milhares de pessoas que desaparecem todo ano” no país. “Ele se preocupou apenas com esses dois. Nós, via nosso Ministério da Mulher e dos Direitos Humanos, nos preocupamos com todos os desaparecidos no Brasil.”
Apoiadores do mandatário desdenharam da seriedade do caso em redes sociais. Um deles afirmou que a “esquerda encontrou duas Marielles para usar contra Bolsonaro”, em alusão à vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada no Rio de Janeiro em 2018 junto com o motorista Anderson Gomes.
Bolsonaro defende garimpos em terras indígenas e preservadas desde antes de assumir o Palácio do Planalto. Na campanha de 2018, ele prometeu que, em seu mandato, não haveria demarcações. Declarou também que daria uma “foiçada na Funai, mas uma foiçada no pescoço”.
Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente entre 2019 e 2021, ficou conhecido por ter usado uma frase que acabou resumindo sua agenda de afrouxamento da legislação de proteção ambiental.
Em uma reunião ministerial no dia 22 de abril de 2020, tornada pública por decisão do STF, Salles afirmou que era preciso aproveitar a atenção dada pela imprensa à pandemia de Covid-19 para “ir passando a boiada e mudando todo o regramento e simplificando normas”.
Por Joelmir Tavares