Oposição vence na Austrália, e conservadores deixarão poder após 9 anos
Governistas tiveram um resultado ruim principalmente na região oeste do país
O primeiro-ministro da Austrália, Scott Morrison, reconheceu neste sábado (21/5) a vitória do Partido Trabalhista, de oposição, nas eleições gerais do país. Horas antes, projeções da mídia local já indicavam que Anthony Albanese, 59, deverá se tornar o próximo premiê.
Morrison, assim, fracassa em sua tentativa de conquistar um quarto mandato consecutivo para a Coalizão Liberal, de centro-direita, e encerra nove anos de período dos conservadores no poder. Os governistas tiveram um resultado ruim principalmente na região oeste do país e em regiões urbanas mais ricas.
Até a publicação deste texto não estava claro se os trabalhistas, de centro-esquerda, obterão a maioria absoluta das 151 cadeiras no Parlamento ou se precisarão formar uma aliança com partidos menores. Com 60% dos votos apurados, a coalizão de Albanese tinha 72 assentos, contra 55 da de Morrison e 11 dos Verdes, segundo a emissora ABC. Outros 13 postos estavam indefinidos, e a apuração pode demorar por causa de votos enviados pelo correio, que atingiram um volume recorde neste pleito.
“[O Partido] Trabalhista precisa de 76 assentos para governar. Há 11 membros independentes, cuja maioria apoia ação contra as mudanças climáticas”, disse o analista Antony Green. “Se os trabalhistas não conseguirem maioria, podem conversar com os Verdes ou com os independentes”.
Mesmo com a indefinição, Morrison, 54, disse a apoiadores em Sydney que telefonou ao rival trabalhista e o parabenizou pela vitória. “Nosso governo entrega esse país em uma posição mais forte do que quando o recebemos”, disse o atual premiê, no poder desde 2018.
Albanese, por sua vez, afirmou que pretende unir o país e, a jornalistas, destacou o compromisso ambiental ao falar em “encerrar as guerras climáticas”.
“Estou pronto para servir. Acho que as pessoas querem estar juntas, procurar por interesses comuns. Elas estão cansadas da divisão, o que elas querem é se unir enquanto nação e eu pretendo liderar esse processo”, afirmou.
A apoiadores o político de ascendência italiana destacou ainda que se sentia honrado em representar um voto por mudança. “Podemos tirar vantagem dessa oportunidade para que a Austrália se converta em uma superpotência da energia renovável.”
O líder dos Verdes, que devem ser a terceira maior força no Parlamento, indicou a disposição de formar uma aliança. “Queremos trabalhar com o [Partido] Trabalhista para enfrentar a grande crise que estamos vivendo. Nossa prioridade é um governo progressista, eficaz e estável”, afirmou Adam Bandt.
O premiê britânico, Boris Johnson, também parabenizou Albanese. Além dos 151 deputados, a eleição deve renovar 40 dos 76 senadores. O voto na Austrália é obrigatório.
O virtual futuro premiê disse ainda que espera assumir logo, para que possa comparecer a uma reunião do chamado Quad -grupo que reúne Austrália, EUA, Japão e Índia e tem como objetivo principal conter a presença chinesa na região do Indo-Pacífico- programada para a terça-feira (24) em Tóquio. Ele ainda prometeu criar uma comissão anticorrupção e garantir reconhecimento constitucional e representação parlamentar para os povos aborígenes.
O resultado deste sábado repetiu 2019 no descompasso em relação ao que mostravam as pesquisas eleitorais. No último pleito no país, os levantamentos indicavam uma vitória trabalhista, mas quem acabou levando a disputa foi o conservador Morrison.
Desta vez, as sondagens feitas a poucos dias da votação indicavam uma disputa apertada e um avanço gradual dos liberais, ainda que os trabalhistas mantivessem uma ligeira vantagem.
As primeiras declarações de Albanese, destacando questões ambientais e o encontro do Quad, realçam os temas centrais da campanha. De forma inédita, a política externa chinesa e seu líder, Xi Jinping, deram o tom, evidenciando a relação estremecida entre os dois países.
No mês passado, na mais recente crise diplomática, o regime de Pequim formalizou acordo de segurança com as Ilhas Salomão, país na região do Pacífico Sul a apenas 1.600 quilômetros da costa nordeste da Austrália. O tratado coloca as forças militares chinesas à disposição do governo salomônico e eleva a tensão em torno de ambições de Pequim no quintal australiano, preocupação crescente nos últimos anos com avanços de Xi sobre o mar do Sul da China.
Antes mesmo de a campanha começar, correligionários do Partido Liberal já diziam, sem provas, que a China atuava pelo êxito de Albanese e que os trabalhistas, no poder, serão subservientes ao regime comunista.
Correligionários do virtual futuro premiê, por sua vez, acusaram o governo Morrison de falhas na segurança nacional devido aos impasses com a China. O distanciamento entre o político conservador e Pequim, porém, foi sacramentado no ano passado com a assinatura de um pacto com EUA e Reino Unido para armar a Austrália com submarinos de propulsão nuclear.
Enchentes e incêndios florestais que assolaram a Austrália nos últimos anos também são motivos de críticas a Morrison. O premiê sofre pressão por mais investimentos na área de energia limpa, mas tem prometido apoio à indústria de mineração de carvão.
O voto do eleitorado feminino parece ter sido outro fator decisivo na eleição deste sábado. Nos últimos meses, o país registrou uma onda de protestos que reuniram milhares de pessoas após denúncias de abusos e assédios que teriam sido cometidos por membros do governo.
Morrison chegou a pedir desculpas públicas à ex-funcionária do governo Brittany Higgins, que denunciou ter sido estuprada por um colega de trabalho em um gabinete ministerial em 2019. Não à toa, a campanha de Albanese reforçou promessa pela igualdade salarial entre homens e mulheres para atrair votos de eleitoras da classe média, grupo considerado fundamental para uma eventual vitória dos trabalhistas.