Com avanço na vacinação, países relaxam protocolos escolares

No Brasil, sem uma coordenação nacional atuante no enfrentamento aos efeitos da pandemia sobre a educação, as decisões sobre os protocolos variam de acordo com o estado

Aula sem revezamento, crianças sem máscara no pátio, fim da quarentena preventiva para alunos vacinados. Medidas como essas, adotadas recentemente por alguns países com vacinação adiantada, permitem vislumbrar o futuro das escolas pós-pandemia.
No Brasil, porém, especialistas alertam que ainda é cedo para pensar em flexibilização diante do atual cenário epidemiológico.

Na luta contra a contaminação por Covid-19 no ambiente escolar, jogam a favor do caminho da normalidade a liberação do retorno de 100% dos alunos adotada em parte dos colégios e a perspectiva de vacinação dos adolescentes, que já começou em outros países e, em São Paulo, está prevista para o próximo dia 18.
Contra a perspectiva do “velho normal” está a variante delta, mais transmissível, que ainda leva países com melhor cobertura vacinal a ter uma cautela extra. Mesmo assim eles têm flexibilizado os protocolos escolares.

Na França, desde a semana passada alunos do ensino médio e superior vacinados não precisam mais ser afastados das aulas presenciais se tiverem tido contato de risco com algum colega infectado. Quase metade da população do país (49,5%) está totalmente vacinada, segundo o portal Our World in Data, contra 20,4% dos brasileiros.
Nos Estados Unidos, também com cerca de metade da população imunizada, não se exige mais o uso de máscaras em ambientes externos, inclusive escolares, desde que não haja aglomeração. Há orientação expressa para que não se faça revezamento de alunos, mesmo que não se possa respeitar a distância recomendável de um metro entre eles.

Para essa decisão das autoridades de saúde americanas, pesou a avaliação de que os danos decorrentes do fechamento das escolas, como os de saúde mental, sobrepõem-se ao risco de contágio.
Estudos mostram que crianças tendem a adoecer de Covid com menos gravidade, e que a dinâmica de circulação do vírus nas escolas não é diferente daquela observada nas comunidades onde elas estão inseridas.
Assim como na França, se estiver vacinado, o adolescente que teve contato próximo com algum caso positivo pode continuar a ir à escola nos EUA –mas deve ser testado.
Diante da variante delta, por outro lado, o governo Joe Biden passou a recomendar o uso de máscara dentro da sala de aula. A determinação é alvo de protestos de grupos de pais, que querem o banimento do acessório.

No Reino Unido, onde o governo Boris Johnson decretou um relaxamento geral das medidas sanitárias sob criticas de especialistas, há regiões que instituíram regras mais rígidas que outras.
De forma geral, porém, a frequência presencial à escola é obrigatória. E, a partir do dia 16, alunos de até 18 anos não precisarão fazer quarentena em caso de contato com caso positivo. O país tem mais de 57% da população com o esquema de imunização completo.
No Brasil, sem uma coordenação nacional atuante no enfrentamento aos efeitos da pandemia sobre a educação, as decisões sobre os protocolos variam de acordo com o estado, a cidade e mesmo a escola.
Para este semestre letivo, o Governo de São Paulo liberou a volta de até 100% dos alunos desde que respeitada a distância de um metro entre eles, em consonância com estudos recentes que consideraram esse parâmetro adequado –o anterior era de 1,5 metro.

A mudança levou algumas escolas da capital, como o Santa Maria e o Pio XII, por exemplo, a acabar com o rodízio de alunos e unificar as turmas, sem adotar as chamadas bolhas –grupos de alunos e profissionais que só convivem entre si no ambiente escolar.
Outras, como Bandeirantes, Brasil Canadá, Pentágono e Scuola Internacional Eugenio Montalecomo, preferiram manter as bolhas.
Para Carla Kobayashi, infectologista do Hospital Sírio-Libanês, as bolhas ainda são importantes para evitar a transmissão em grandes grupos e facilitar o rastreamento de contatos. Ela ressalta, por outro lado, que foram pouquíssimos os casos de transmissão dentro da escola identificados no primeiro semestre.

O hospital tem prestado consultoria a colégios privados. Em caso de aluno com Covid confirmada, a orientação é monitorar os demais colegas e afastar a turma toda só se houver indício de que houve transmissão dentro da turma –como um segundo caso de contato próximo, por exemplo.
Já no Albert Einstein, que também tem orientado colégios, a indicação é afastar a turma toda se houver um caso confirmado, ainda que somente um.
Para Cléber de Moraes Motta, consultor médico de projetos em saúde, a vacinação de adolescentes não deve mudar a orientação. “Quando pensamos na pandemia, é preciso pensar em medidas coletivas, pois mesmo a pessoa vacinada pode se infectar e transmitir.”

Infectologista e diretor clínico do Grupo Fleury, Celso Granato acrescenta que os pais têm papel fundamental ao não enviar crianças com qualquer sintoma. “Dificilmente o professor vai conseguir olhar o nariz de cada criança para ver se está resfriada, por exemplo.”
Após mais de um ano de pandemia, parte das famílias ainda tem receio de enviar os filhos de volta à escola, principalmente na rede pública.
Enquanto escolas particulares como Humboldt e Santa Amália, entre outras, tiveram o retorno de quase todos os alunos, na rede municipal de São Paulo a frequência foi de cerca de dois terços dos estudantes.

Esse receio inicial das famílias aconteceu também em outros países, diz Carolina Campos, da consultoria Vozes da Educação, que tem feito levantamentos sobre a resposta de diferentes governos aos impactos educacionais da pandemia.
“A gente tem que comparar com outros países quando eles estavam em uma situação similar. Quando os Estados Unidos estavam com 20% de cobertura vacinal, não estavam tirando máscara”, diz. “Na França e na Dinamarca, a angústia dos pais de levar para a escola também aconteceu no início da volta das escolas, mas em maio do ano passado.”

Mesmo em países como Chile, com maior cobertura vacinal, mas onde ainda há uma incidência relevante de casos, ainda se adota revezamento de alunos, máscara e afastamento de contactantes.
“As pessoas estão achando que está todo mundo vacinado, mas a nossa cobertura vacinal ainda é baixa. Os adolescentes, se começarem a ser imunizados em agosto, só estarão protegidos no final do ano. Não dá para imaginar um futuro com maior flexibilização nas escolas no Brasil antes de 2022”, diz Carla, infectologista do Sírio-Libanês.

Texto ANGELA PINHO

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