Brasileiro é acusado de integrar quadrilha que cobrava US$ 30 mil por casamentos falsos nos EUA
Outros suspeitos eram filipinos
Um brasileiro foi indiciado e recebeu ordem de prisão na Califórnia por participar de uma quadrilha que organizava casamentos de fachada, para que imigrantes pudessem obter vistos de permanência nos Estados Unidos.
De acordo com o processo, obtido pela Folha, o brasileiro Peterson Souza, 34, tinha a função de recrutar interessados em obter um green card americano. Souza, que morava em Anaheim, Califórnia, teria indicado ao menos 25 pessoas, e recebido US$ 2.000 por recomendação.
O líder da quadrilha de 11 pessoas foi apontado como Marcialito Benitez, 48, filipino que morava em Los Angeles. Ele operava, ao menos desde outubro de 2016, uma agência de casamentos arranjados que teria organizado cerca de 400 matrimônios falsos e movimentado US$ 8 milhões. Os outros suspeitos também eram, em sua maioria, filipinos.
Nesta quinta (7/4), o Departamento de Justiça dos EUA anunciou já ter prendido oito dos integrantes da quadrilha –não foi informado se Souza estaria entre eles. Se condenados, os envolvidos podem pegar até cinco anos de prisão e ter de pagar multa de até US$ 250 mil.
Mensagens apreendidas na investigação mostram que Souza indicou clientes para o grupo várias vezes ao longo de 2021. Em julho, porém, ele reclamou que pessoas que ele havia indicado estavam tentando fechar negócio direto com Benítez, para pagarem menos. “Brasileiros sempre tentam falar com você direto e me cortar, para você cobrar menos por não ter de pagar uma comissão”, escreveu em uma mensagem.
O esquema buscava unir imigrantes em busca de visto a cidadãos americanos interessados em ganhar dinheiro com fraudes. Ao se encontrar com a quadrilha, os estrangeiros podiam escolher um futuro cônjuge a partir de fotos.
Cada interessado (ou interessada) precisava pagar, em dinheiro vivo, entre US$ 20 mil e US$ 30 mil. Em um dos casos, a proposta era a de pagar US$ 18 mil para o grupo e mais US$ 10 mil para o americano que se casaria no papel, em parcelas mensais de US$ 350.
Pela lei americana, cônjuges de cidadãos do país têm direito a permanecer e trabalhar no país de modo regular. Após o casamento, eles ou elas recebem documentos como permissão de residência (chamado de green card) e de trabalho. Após alguns anos, podem pedir a cidadania plena.
O sistema de imigração americano prioriza os pedidos de visto permanente feitos com base em casamentos. Eles passam na frente de outras solicitações, que podem levar anos para serem analisadas. No entanto, o governo americano busca investigar se os casamentos são legítimos.
Fechado o acordo, a quadrilha levava os pares em lojas, para comprar roupas de festa. As cerimônias eram feitas em capelas nas quais os donos não faziam muitas perguntas sobre a origem do casal. Membros do grupo tiravam fotos da celebração e dos noivos perto de decorações de festa, para dar mais veracidade à farsa.
Passada a celebração, a quadrilha buscava montar o pedido por documentos. O grupo buscava meios de adulterar os documentos dos americanos, para fazer parecer que eles eram mais ricos, de modo a não levantar suspeitas. Uma das táticas era montar falsas declarações de imposto de renda, a serem apresentadas ao serviço de imigração.
Uma mulher que aceitou participar da fraude e se casar no papel contou que estava vivendo com o filho em um hotel de beira de estrada.
Outras táticas eram abrir contas conjuntas em nome do casal falso e registrar veículos no nome dos dois.
Eles também podiam declarar que moravam em endereços pertencentes à quadrilha. O plano também previa fazer fotos românticas em lugares públicos, para criar evidências de uma relação real.
Além dos documentos, a agência oferecia treinamento para a entrevista a ser feita com as autoridades de imigração. O casal era orientado a demonstrar ter uma boa química e respostas prontas para questões triviais como “qual a cor da escova de dentes da sua mulher?”.
Nem todos os participantes ajudavam, no entanto. A quadrilha precisou pedir, algumas vezes, para que os cônjuges falsos apagassem fotos em redes sociais que tinham postado com seus parceiros reais.
Em alguns casos, os cidadãos americanos desistiam do processo e sumiam antes da entrevista no departamento de imigração.
Para casos assim, foi criada uma solução: aproveitar um mecanismo da Lei de Violência contra as Mulheres, que permite a imigrantes recém-casados com americanos darem entrada em pedidos de cidadania sem o aval deles.
A medida foi criada para proteger vítimas de violência doméstica, ao impedir que cidadãos americanos ameaçassem negar o acesso a documentos, como forma de coação. Em casos assim, a quadrilha chegava a forjar depoimentos de que a imigrante tinha sido alvo de maus tratos por parte do parceiro americano.
A data para o julgamento ainda não foi marcada. Autoridades dos EUA disseram que ações assim prejudicam especialmente os imigrantes que buscam obter a cidadania americana de forma legítima.
Por Rafael Balago