No ‘Argentina x Brasil’ do hóquei sobre a grama, Holanda ganha o ouro nas Olimpíadas
A inevitável medalha de ouro veio na manhã desta sexta-feira (6/8), horário de Brasília, com a vitória na final por 3 a 1 sobre a Argentina
Quando a porta do ônibus se abriu, as jogadoras da Holanda desceram ao som de “Don’t Stop Me Now” (Não me pare agora, em inglês), clássico da banda britânica Queen. Era um chamado à batalha para uma equipe que nas Olimpíadas de Tóquio foi imbatível.
A inevitável medalha de ouro veio na manhã desta sexta-feira (6/8), horário de Brasília, com a vitória na final por 3 a 1 sobre a Argentina.
Foi uma derrota doída para as sul-americanas. Isso ficou evidente no choro incontrolável da goleira Maria Succi, 35, a segunda mais velha em campo. Ela pode ter perdido a última chance de sua carreira de ganhar um ouro olímpico.
“Elas são as melhores do mundo. Fizemos de tudo em campo. Não há muito o que dizer”, tentou resumir a capitã Maria Barrionuevo, 37, veterana de quatro Olimpíadas.
Foi sofrido para a Argentina, não apenas porque era a melhor chance do país subir ao lugar mais alto do pódio (até então, o país tinha apenas um bronze). A derrota aconteceu contra adversário que, no hóquei sobre a grama feminino, representa o mesmo que o Brasil no futebol em termos de rivalidade.
Alguns integrantes da delegação alviceleste e funcionários do comitê nacional tentaram colocar um clima de futebol no Oi Hockey Stadium. Ensaiaram gritos pedindo raça, porque “esta noite temos de ganhar.” Uma canção conhecida nos estádios da América do Sul.
Eram 11 em campo, havia uma bola e um gramado azul (não verde), juízas vestidas de preto e o recurso do VAR. As holandesas até aqueceram com trocas de passes com bola de futebol sem deixá-la cair. Mas a comparação fica por aí. O jogo tem quatro tempos de 15 minutos e os pés são o taco que cada atleta usa para controlar a bola.
É o esporte em que a Argentina tinha esperanças de quebrar a hegemonia da rival. Nas três Olimpíadas anteriores, a Holanda não foi ouro apenas na Rio-2016. Perdeu final para a Grã-Bretanha que ficou marcada na memória da modalidade no país.
Em Tóquio, a seleção de uniforme laranja venceu todas as suas oito partidas. Fez 29 gols e levou quatro. São 20 vitórias consecutivas agora das holandesas. A última derrota da equipe foi imposta pela Argentina, em fevereiro do ano passado, em Buenos Aires.
“Por isso que eu queria que a equipe atacasse. Nós já tínhamos mostrado que poderíamos vencê-las. Mas nada a reclamar. Essas garotas foram guerreiras”, defendeu o técnico Carlos Retegui.
A rivalidade entre os times é como nenhuma outra no esporte mundial porque chega a uma casa real. As jogadoras mais antigas da Argentina não esquecem o rei Guilherme, da Holanda, a acenar para os torcedores rivais e repetindo, em espanhol mesmo, “próxima vez, próxima vez”. As duas seleções haviam acabado de se enfrentar nas quartas de final da Rio-2016, com vitória europeia.
Ao lado de Guilherme, estava a rainha Máxima, nascida na Argentina. Ela sorriu com a festa do marido. Não pegou bem em sua terra natal.
“Para nós, é um clássico. É como um Argentina x Brasil mesmo. São as duas melhores equipes do mundo. A nossa rivalidade é com elas. Não tenho afinidade e não gosto delas. Não gosto nem de cumprimentá-las”, define Rosario Luchetti, que não foi chamada para Tóquio, mas foi prata em Pequim-2008 e bronze em Londres-2012.
O título tem chegado perto das argentinas de maneira quase hipnotizante, mas elas não conseguem ganhá-lo. A Holanda não tem esse bloqueio. O time feminino foi campeão mundial oito vezes. Um domínio que começou em 1974, com a vitória por 1 a 0 na decisão contra a mesma adversária na disputa pelo ouro em Tóquio.
Nas Olimpíadas agora elas têm quatro ouros (1984, 2008, 2012 e 2021), duas pratas (2004 e 2016) e três bronzes (1988, 1996 e 2000).
“Nós lutamos. Antes do jogo, achava que seria 50-50 e que elas tinham pontos fracos que poderiam ser aproveitados. Mas não aconteceu. Temos de aceitar. Esta medalha é resultado de muita luta”, definiu Delfina Marino, um dos nomes mais importantes da história do hóquei sobre a grama, com 98 gols em 303 confrontos internacionais.
A Holanda dominou grande parte da partida e no primeiro quarto, apesar do placar sem gols, a Argentina quase não conseguiu passar do meio-campo. Na segunda parte, aconteceram os quatro tentos do duelo.
A Holanda fez três porque soube aproveitar as infrações da rival. Faltas que provocam cobranças em que a bola sai da linha de fundo e o time que ataca tem a chance de finalizar. Quem se defende conta com a goleira e três defensoras deixando o gol para tentar abafar o arremate. Em uma trinca de oportunidades dessas, as europeias anotaram duas vezes e acertaram uma no travessão.
Após a entrega das medalhas, as argentinas foram as últimas a deixarem o campo. Ficaram sentadas no pódio a tirarem selfies e fazerem chamadas de vídeo, enquanto funcionários dos Jogos sinalizavam para que fossem embora.
O DJ do estádio resolveu que as sul-americanas, derrotadas em seu maior clássico do hóquei sobre a grama, deixariam o gramado ao som da canção “Bad Day” (dia ruim), de Daniel Powter. A letra diz que se você tem um dia ruim, se esforce para sorrir.
“Para nós, isso aqui é uma medalha dourada. Não me importa a cor, isso é uma loucura”, finalizou Albertario.