Fátima Toledo, acusada de abusos em set, irá à Justiça e condena cancelamento
Caso veio à tona após declarações da atriz Denise Weinberg ao site Notícias da TV
Preparadora de elenco há mais de 40 anos, Fátima Toledo tem sido acusada de abusos físicos e psicológicos por parte de profissionais que já trabalharam com ela. Um manifesto da ONG Respeito em Cena contra violência no set e que defende ambientes mais saudáveis nas gravações já conta com mais de 200 assinaturas.
Tudo isso veio à tona após declarações da atriz Denise Weinberg ao site Notícias da TV, em que afirma ter sido torturada, pisoteada e xingada durante treinamento comandado por Fátima em 2008 nos bastidores do filme “Linha de Passe”.
“Fui torturada. Botaram o pé na minha nuca, mandaram dizer que eu era uma merda. Ela [Fátima] falou na minha cara a merda de atriz que eu era, que não precisava de atrizes. Eu tive sequelas. Falei da humilhação, mas é uma violação dos direitos humanos. Tive hemorragia, perdi a voz”, disse. Vários profissionais do universo da dramaturgia, como Paulo Betti, Guta Stresser e Daniel Dantas, se solidarizaram com o relato assinando o documento.
Em entrevista à reportagem, Fátima se defende das acusações e diz que vai à Justiça. “Me deparar com uma cruzada vil de tentativa de destruição de minha reputação com base em mentiras, corroboradas por uma corrente de cancelamento partindo de pessoas que não conhecem meu trabalho, certamente será objeto de medidas judiciais cabíveis”, afirma.
A preparação feita por Fátima Toledo nos bastidores dos projetos, segundo ela, é dividida sempre em três partes. Na primeira, são aplicados exercícios adaptados para o assunto do filme para revelar a distância, a proximidade, possíveis bloqueios e potencialidades do elenco com relação ao tema principal.
Na segunda etapa são definidos o que cada membro do elenco precisa para atingir o nível máximo para o papel. E a terceira etapa é a de levantamento das cenas do filme com os atores.
“Em todos esses 40 anos, a confiança que tantos atores, não-atores, diretores e produtores depositaram no método só foi possível por essa entrega honesta para juntos descobrir, enxergar e ir além do lugar-comum”, emenda Fátima.
Segundo ela, nunca ninguém foi forçado a participar de alguma preparação, workshop ou classe. “Essa escolha sempre foi e continuará sendo de cada participante.”
Fátima Toledo recebeu elogios de Wagner Moura em entrevista recente no Roda Viva (Cultura). Ela trabalhou com ele em “Tropa de Elite” (2008) e no seu mais recente projeto, “Marighella” (2021). Porém, essa defesa motivou que mais atores e atrizes quisessem levar adiante as denúncias.
Procurado pela reportagem, Moura reforça que trabalhou com Fátima em cinco longas e que nunca presenciou nenhuma atitude suspeita por parte dela. “Vi que muitos colegas que assinaram aquela carta nunca trabalharam com ela e acho esse movimento perigoso. Não compactuo com nenhum movimento de cancelamento, de linchamento, sobretudo contra uma pessoa que eu conheço, respeito, admiro”, diz.
OUTROS ATORES FALAM DA PREPARADORA
Atores como Ricardo Blat e Bruno Gagliasso defendem a metodologia utilizada por Fátima Toledo. Em depoimentos à reportagem, contam que nunca tiveram ou presenciaram qualquer problema com a profissional. Ao contrário, elencam o que mais os ajudou em suas trajetórias.
“As minhas experiências com a Fátima são as melhores e ela segue e seguirá tendo todo o meu respeito, admiração e gratidão. Num resumo simplório, posso dizer que Fátima Toledo é a mulher que me trouxe de volta algo que, em algum momento, eu achei que estava perdido ou que fazia no automático: o amor à arte”, resume Gagliasso que foi preparado por ela em séries como “Operación Marea Negra” e no filme “Marighella”.
Ricardo Blat se refere a Fátima como “extraordinária mestre”. Ele foi preparado por ela para um projeto da Amazon de nome “Cangaço Novo”, ainda em processo de filmagem, e afirma que “há tempos não tinha a oportunidade de renovar minhas ferramentas física, emocional, mental e espiritual de forma tão eficiente”.
Alice Braga, que com a profissional trabalhou no começo da carreira em projetos como “Cidade de Deus” e “Cidade Baixa”, afirma que passou com ela pelos processos de trabalho mais intensos e profundos. “Mas que me fizeram crescer e buscar cada vez mais me desafiar e alimentar mais.”
Já Herson Capri, que foi um dos atores que assinou o decreto, não cita o nome de Fátima em seu depoimento, mas declara que no filme “Marighella” foi tratado “com elegância e carinho por todos durante todo o processo”.
A atriz Carla Ribas dá mais detalhes sobre uma das preparações que fez com Fátima Toledo. Primeiro, afirma que a profissional é admirável, dedicada ao seu trabalho e vibra por cada conquista de cada ator. Mas conta que por vezes o ator sofre na preparação.
“Já sofri bastante nos ensaios com ela, mas não sou lá muito de ter medo de sofrimento, faz parte da vida e das histórias das personagens mais interessantes. Se eu já me machuquei? Sim, fui com força demais, me atirei com intensidade em alguns exercícios. Óbvio que não posso falar por todos e sei que cada experiência é única, mas acho perigoso esse julgamento sumário da internet.”
O ator Luiz Carlos Vasconcelos, outro do elenco de “Marighella”, confidencia que com tudo o que tinha ouvido falar sobre o trabalho de Fátima ficou com o pé atrás e, a princípio, não entrou em nenhuma das propostas de jogo cênico feitas pela profissional.
Porém, ele mudou de ideia. “A preparação é uma teatralidade onde quem conduz está propondo jogos e o ator poderá sempre dizer se quer participar ou se está fora. Passei a entender tudo como um grande jogo cênico e nunca como um território de abusos.”
A O2 Filmes se pronunciou por meio de nota assinada por Andrea Barata Ribeiro. Segundo a produtora, a relação entre a empresa e Fátima acontece há cerca de 25 anos e nunca houve nenhuma acusação contra ela.
“Também acreditamos que todas as pessoas podem se aprimorar e se adaptar aos novos tempos. A recente prática de ter um mediador neutro de conflitos nos sets de filmagens tem ajudado bastante a evitar eventuais abusos”, diz trecho.
Em outra parte do comunicado, a O2 afirma: “Não compactuamos com o cancelamento de pessoas. Ainda mais a Fátima, profissional com quem só tivemos experiências positivas”. E encerra: “Diálogo é importante, mas caça às bruxas, não.”
Por Leonardo Volpato