Produção industrial sobe em fevereiro, mas segue abaixo do pré-pandemia
Indicador segue abaixo do patamar
A produção industrial conseguiu avançar no Brasil em fevereiro, mas não teve força para reverter todas as perdas recentes. O indicador segue abaixo do patamar pré-pandemia, informou nesta sexta-feira (1º) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
No segundo mês do ano, a produção das fábricas subiu 0,7% em relação a janeiro. O resultado veio um pouco acima das expectativas do mercado financeiro. Analistas consultados pela agência Bloomberg projetavam alta de 0,5% na mediana.
O desempenho positivo eliminou uma parte da queda de 2,2% registrada em janeiro. Contudo, o setor ainda está 2,6% abaixo de fevereiro de 2020, antes das restrições da crise sanitária.
Também registra nível 18,9% menor do que o recorde da série histórica, verificado em maio de 2011.
“Teve uma melhora na margem. Fevereiro traz crescimento, mas a produção industrial está longe de eliminar todas as perdas do passado recente”, indicou André Macedo, gerente da pesquisa do IBGE.
Segundo ele, o setor ainda é afetado por uma combinação de efeitos negativos, como escassez e carestia de insumos, fragilidades no mercado de trabalho e redução do poder de compra dos brasileiros.
A divulgação desta sexta é a primeira após o IBGE atualizar o modelo de ajuste sazonal da pesquisa. Conforme o instituto, o procedimento é padrão em levantamentos do tipo, e teve de ser adiado devido a restrições geradas pela pandemia.
“A atualização significa pouquíssimas mudanças. Claro, em um mês ou outro, tem alguma diferença de resultado”, afirmou Macedo.
PRODUÇÃO SOBE EM 16 DAS 26 ATIVIDADES INDUSTRIAIS
O avanço de 0,7% em fevereiro foi sustentado por taxas positivas disseminadas em 16 dos 26 ramos pesquisados na indústria.
As influências mais importantes, entre as atividades, vieram das indústrias extrativas (5,3%) e de produtos alimentícios (2,4%).
“O setor extrativo teve uma queda importante em janeiro [-5,1%], por conta do maior volume de chuvas em Minas Gerais naquele mês, o que prejudicou a extração do minério de ferro. Com a normalização das chuvas, houve uma regularização da produção”, disse Macedo.
“Já o setor alimentos teve seu quarto mês positivo de crescimento, acumulando no período ganho de 14%. Em fevereiro, os destaques foram a produção de açúcar e carnes e aves, dois grupamentos importantes dentro do setor”, completou.
Outras contribuições positivas vieram de ramos como produtos farmoquímicos e farmacêuticos (12,7%), veículos automotores, reboques e carrocerias (3,2%), metalurgia (3,3%), bebidas (4,1%), outros equipamentos de transporte (15,1%) e borracha e plástico (2,9%).
“O mês de janeiro é caracterizado por ter algum grau de redução de jornadas de trabalho e pelo movimento maior de férias coletivas. Em fevereiro, há o retorno normal ao trabalho, que impulsiona a produção do mês. Isso ajuda a entender o resultado positivo de fevereiro”, avaliou Macedo.
De acordo com o IBGE, 18 das 26 atividades industriais ainda estão abaixo do pré-pandemia.
Em fevereiro, o segmento de móveis ficou em nível 23% inferior ao de igual mês de 2020. É a maior distância negativa da pesquisa.
Por outro lado, sete ramos industriais superam o pré-crise. A atividade de máquinas e equipamentos está 12% acima do pré-coronavírus, a maior distância positiva da série.
O segmento de metalurgia, por sua vez, é o único que registra patamar igual ao de antes dos efeitos da pandemia.
O IBGE ainda informou que, em fevereiro, a produção industrial caiu 4,3% se comparada ao mesmo mês de 2021. Nesse recorte anual, analistas do mercado esperavam retração ainda maior, de 4,9%, conforme a Bloomberg.
Em 12 meses, a produção das fábricas acumulou alta de 2,8%. A elevação já foi maior nessa base de comparação ao longo de 2021, o que sinaliza perda de fôlego.
“A produção industrial até deu sinais de que o pior talvez tenha ficado para trás. Mas o quadro é delicado. A gente ainda vê muitas fragilidades”, afirma o economista Rodrigo Nishida, da LCA Consultores, que projeta variação de 0,3% para o indicador no acumulado do ano.
AMEAÇAS NO RADAR
Ao longo da pandemia, a escassez de insumos veio acompanhada do aumento dos preços. Em fevereiro, a inflação industrial foi de 0,56%, de acordo com o IPP (Índice de Preços ao Produtor).
Esse indicador também é calculado pelo IBGE. Em 12 meses, a alta do IPP foi de 20,05%. O índice mede a variação dos preços na porta de entrada das fábricas, sem o efeito de impostos e fretes.
Segundo analistas, outro desafio para a indústria em 2022 é o aumento dos juros. Para tentar conter a inflação, o BC (Banco Central) vem elevando a Selic, que alcançou 11,75% ao ano -e deve subir mais.
A taxa básica de juros em dois dígitos encarece o custo dos empréstimos, o que dificulta investimentos de setores produtivos.
“A indústria sente o efeito da renda menor, da inflação, dos gargalos de insumos e dos juros mais altos, que pegam na veia das empresas. É uma combinação que não deve mudar nos próximos meses”, analisa José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator.
“Espera-se que o setor industrial encare ventos contrários à frente, a partir de condições financeiras mais apertadas, fraca demanda à medida que a inflação corrói a renda real disponível, problemas persistentes na cadeia de suprimentos e altos custos de logística, energia e outros insumos”, projeta relatório do banco Goldman Sachs.
A partir de fevereiro, o cenário macroeconômico ganhou uma preocupação a mais com a guerra entre Rússia e Ucrânia. A tensão vinda do Leste Europeu fez as cotações de commodities agrícolas e do petróleo dispararem em um primeiro momento no mercado internacional.
O conflito, na visão de analistas, ameaça tanto os preços de insumos quanto os custos logísticos no setor industrial, já pressionados pela pandemia.
“Como a guerra vai impactar os resultados [da produção], a gente não tem como mensurar. Tem risco em algo que a gente já vê nas cadeias produtivas globais, no abastecimento [de insumos]. Ou seja, isso pode piorar. Mas é algo importante a ser observado”, apontou André Macedo, do IBGE.
Por Leonardo Vieceli