Intensidade do primeiro corte de juros deve dividir Copom em estreia de indicados por Lula

A intensidade do primeiro movimento -redução de 0,25 ou de 0,5 ponto percentual- tende a ser motivo de divergência entre os membros do colegiado

NATHALIA GARCIA
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central deve dar início nesta quarta-feira (2) ao ciclo de cortes de juros após ter mantido durante um ano a taxa básica (Selic) inalterada no patamar de 13,75%. A intensidade do primeiro movimento -redução de 0,25 ou de 0,5 ponto percentual- tende a ser motivo de divergência entre os membros do colegiado.

A divisão do grupo, que já havia sido esboçada na ata da reunião de junho, deve ganhar um novo impulso com a chegada dos primeiros diretores indicados pelo governo Lula (PT) -Gabriel Galípolo (Política Monetária) e Ailton Aquino (Fiscalização).

Enquanto a gestão petista pressiona por uma queda mais acentuada dos juros, em meio ao avanço da pauta econômica no Congresso Nacional e à melhora da nota de crédito do Brasil pela Fitch, o Copom vinha até então defendendo “parcimônia” e “cautela” na condução da política monetária.

Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica do Goldman Sachs para América Latina, diz que provavelmente haverá uma “decisão dividida”, mas que o BC tende a começar o ciclo de afrouxamento monetário com um corte de 0,25 ponto percentual, levando a Selic a 13,50% ao ano.

O economista projeta que, se o Copom optar de fato por esse movimento mais suave, deixará aberta a possibilidade de acelerar o ritmo de cortes. No entanto, caso a queda inicial seja de 0,50 ponto percentual, o comitê pode sinalizar a manutenção dessa mesma magnitude no próximo encontro, em setembro.

“O que se quer é não queimar a largada, porque isso pode ter depois consequências para frente”, diz. “Se o primeiro passo for sólido, ele [BC] pode eventualmente ir mais longe no processo de distensão monetária.”

Além da sinalização dada pelo Copom no último encontro, ele considera que os dados ainda justificam alguma cautela e vê riscos inflacionários à frente.

Ramos ressalta que as expectativas de inflação para 2025 e 2026 estacionaram em 3,5% -acima do centro da meta de 3%- depois de uma melhora impulsionada pela definição do CMN (Conselho Monetário Nacional) pela manutenção do objetivo de 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos, no modelo de alvo contínuo.

Para o economista, isso pode refletir uma visão do mercado de que o governo está inclinado a ser mais tolerante a uma inflação mais elevada e um entendimento que as mudanças na composição do Copom possam torná-lo mais permissivo.

De junho para cá, segundo o boletim Focus, a projeção para o IPCA deste ano foi revisada de 5,12% para 4,84%. Para o ano que vem, a expectativa caiu de 4% para 3,89%. Para 2025, a estimativa dos economistas baixou para 3,5%, ante 3,8%.

Ramos também cita potencial impacto do El Niño (fenômeno de aquecimento das águas do Pacífico), a defasagem dos preços de combustíveis em relação aos valores internacionais, a inflação de serviços pressionada e a atividade econômica resiliente, além de uma “certa deterioração” da política fiscal.

O corte de 0,25 ponto percentual também é a aposta do Itaú Unibanco, mesmo que a curva de juros do mercado financeiro já contemple a possibilidade de um movimento mais intenso.

A economista Julia Gottlieb argumenta que a dinâmica de núcleos -que medem o comportamento dos preços desconsiderando ou reduzindo o peso de fatores temporários sobre os índices- e expectativas de inflação ainda estão acima da meta. Diz também que a atividade econômica e o mercado de trabalho continuam resilientes e aquecidos.

“Pode ter alguma divergência [entre os membros do Copom], mas o ponto principal é olhar o que a conjuntura econômica prescreve em termos de política monetária”, afirma.

Um estudo do banco obtido pela reportagem, assinado por Gottlieb e Julia Passabom, mostra que ciclos anteriores que começaram com cautela foram bem-sucedidos em levar a inflação para perto da meta, possibilitando um equilíbrio final de juros mais baixos por mais tempo.

No estudo, o Itaú analisou cinco episódios de cortes de juros. Em duas ocasiões (2005 e 2016), o BC iniciou o afrouxamento monetário com corte de 0,25 ponto percentual e uma vez (2009) em ritmo mais intenso, de 1 ponto percentual. Nos anos de 2011 e 2019, o ciclo teve início com cortes de 0,50 ponto percentual.

“Esse [corte] de ritmo mais intenso foi em um contexto de crise global, de 2008, houve uma redução coordenada de juros globais porque teve uma contração muito forte da atividade econômica em todo o mundo. Então, o início dele não é 100% comparável porque foi uma situação atípica, o mundo estava em crise”, pondera. “A comparação é menos justa.”

De acordo com o relatório, cortes de juros mais agressivos já na largada podem levar a uma eventual depreciação cambial. “O real tende a se desvalorizar após o primeiro corte de juros do Copom. Um início de corte mais cauteloso pode atenuar esse efeito”, diz o texto.

Outro potencial reflexo seria uma eventual piora nas expectativas dos agentes do mercado financeiro -o que poderia até interromper o processo de desinflação em curso.

Diferentemente de reuniões anteriores, dessa vez não há unanimidade no mercado financeiro.

Rafaela Vitória, economista-chefe do banco Inter, argumenta que o BC já esperou tempo demais para começar a cortar os juros e chega nesse momento com espaço suficiente para ser mais agressivo no primeiro movimento. Ela cita a desaceleração do crédito e arrefecimento da inflação corrente e de núcleos.

Sinalizando uma tendência para os preços, o IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15) teve queda de 0,07% em julho, com recuo dos preços de energia elétrica e alimentos. O índice oficial de inflação do Brasil (IPCA) será conhecido apenas no dia 11 de agosto.

Apesar da melhora na conjuntura econômica, Vitória não descarta que a autoridade monetária opte por ser mais conservadora, caso queira ser mais “literal” na tentativa de trazer as expectativas do mercado em direção às metas de inflação e busque colocar freio nas projeções à frente.

“Se vier um corte de 0,25 [p.p.] não será uma grande surpresa. Existe uma divisão nessa leitura do cenário atual. Vejo 60% de chance em um corte de 0,50 p.p. e 40% de chance de um corte de 0,25 p.p..”, afirma.

“Não vai ser uma decisão consensual, nossa aposta é de [corte de] 0,50 [ponto percentual], mas a gente espera que tenham inclusive votos por [corte de] 0,25 [p.p.]”, acrescenta.

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