Guedes insiste em criar fundo com dinheiro de estatais para pagar benefício social fora do teto

Ideia de usar fundo com dinheiro de estatais para bancar bônus social fora da regra fiscal foi alvo de críticas

Com o indicativo de que o Judiciário pode resolver o problema do excesso de sentenças judiciais para o governo pagar em 2022, o que dispensaria a aprovação da PEC (proposta de emenda à Constituição) dos precatórios, o ministro Paulo Guedes (Economia) pretende insistir na ideia de implementar um fundo com recursos de estatais para bancar repasses a programas sociais.

Membros da equipe econômica avaliam que com a solução coordenada pelo presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Luiz Fux, estará resolvido o problema dos precatórios -dívidas do governo reconhecidas pela Justiça e sem possibilidade de recurso. Com isso, a discussão sobre o fundo seria facilitada.

Para integrantes do ministério, como a solução abre o Orçamento do governo e viabiliza o Bolsa Família turbinado, a liderança de Fux nesse debate é um sinal de trégua e pode apaziguar a turbulenta relação entre o governo e o Judiciário.

A PEC apresentada pelo governo para parcelar precatórios prevê a criação de um fundo alimentado por verbas da venda de ativos da União. O texto libera o uso desses recursos apenas para abater dívida pública e quitar precatórios, mas o desejo de Guedes era incluir no Congresso a possibilidade de pagar “dividendos sociais”, uma espécie de bônus a beneficiários do novo Bolsa Família.

A ideia é alvo de críticas porque a PEC de Guedes autoriza que o fundo faça pagamentos sem contabilizar no teto de gastos, regra que limita o crescimento das despesas do governo à variação da inflação.

O plano também foi criticado por especialistas porque a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal) proíbe que o governo use verbas provenientes da venda de bens do patrimônio público para bancar despesas correntes, como programas sociais.

Membros da equipe econômica argumentam que a PEC tem hierarquia superior e se sobrepõe à LRF e, portanto, não haveria problema legal.

Interlocutores do ministro dizem ainda que o teto de gastos estimula uma diminuição do tamanho do Estado, o que ocorreria efetivamente com a venda de estatais. Além disso, afirmam que esse seria um gasto extraordinário, apenas quando houver recurso disponível.

Diante do novo cenário, há duas possibilidades para o plano do ministro. Uma alternativa seria apresentar uma nova PEC tratando exclusivamente do fundo e dos dividendos sociais. Outra opção é aproveitar a PEC dos precatórios que já tramita no Congresso, descartando a parte do parcelamento dos débitos e mantendo apenas a criação do fundo.

Ao longo das negociações sobre a PEC, membros da pasta reconheceram que o fundo era um fator a mais de risco fiscal. O secretário especial do Tesouro e Orçamento, Bruno Funchal, afirmou neste mês que o problema dos precatórios era complexo e que a discussão sobre os dividendos sociais deveria ficar para depois.

De acordo com interlocutores do ministro, a solução comandada por Fux, em parceria com governo, Legislativo e o ministro do TCU (Tribunal de Contas da União) Bruno Dantas, facilita a negociação sobre os dividendos sociais porque separa as discussões.

A avaliação é que o principal problema, a expansão de gastos com precatórios, será resolvido e haverá uma redução do risco de judicialização do tema no futuro.

A solução para os precatórios não dependeria de aprovação pelo Congresso porque bastaria a edição de uma resolução pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) para modular quanto o governo deverá pagar no ano.

A proposta prevê estabelecer um teto para o gasto do governo com as sentenças judiciais em 2022 em R$ 39,9 bilhões. O valor corresponde a menos da metade do montante previsto atualmente para o ano que vem, de R$ 89 bilhões.

Com isso, o governo economizaria -em ano eleitoral- um total de R$ 49,1 bilhões. O valor é mais alto do que os R$ 33,5 bilhões de impacto previsto pelo governo para a PEC. A medida abriria espaço no Orçamento para a implementação do Bolsa Família turbinado e ampliação de gastos com obras públicas.

Na quinta-feira (26), Guedes sinalizou que o governo pode abrir mão da PEC se o Judiciário conseguir implementar a solução alternativa.

O plano prevê que seja considerado o valor da dívida do governo com precatórios quando da edição do teto de gastos, acrescido da variação da inflação. O valor seria pago no Orçamento de 2022 e o restante nos exercícios subsequentes, com prioridade para as dívidas de menor valor e para os precatórios alimentícios.

A criação do fundo com benefício pago a programas sociais é uma estratégia de Guedes para estimular o Congresso a autorizar a privatização de estatais. Isso porque o governo não conseguiu vender nenhuma empresa pública até o momento.

O plano original da equipe econômica previa repassar para o dividendo social 20% de todos os recursos que entrassem no fundo.

No texto da PEC, o fundo seria alimentado por verbas provenientes de privatizações e venda de outros ativos, além do saldo de dividendos gerados pelas empresas públicas. A ideia é manter esse formato para os dividendos sociais.

Por Bernardo Caram e Matheus Teixeira

 

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