Espetáculo “Abre Alas: Concerto à Doidivana” homenageia a concertista e maestra Chiquinha Gonzaga
De maneira inédita, o evento traz apresentações gratuitas por meio do circo-teatro e com a linguagem da palhaçaria musical
Muito pouco ou quase nada se fala sobre o teor cômico de parte das composições da compositora, pianista e regente brasileira Chiquinha Gonzaga. É esta faceta de um dos grandes nomes da música brasileira dos séculos XIX e XX que será evidenciada em “Abre Alas: Concerto à Doidivana”, a partir de 19 de agosto.
O espetáculo cômico musical, criado a partir das referências do circo-teatro e da musicalidade dos palhaços cantores e excêntricos musicais, vai percorrer a capital federal para uma série de 10 apresentações, divididas entre escolas públicas e as ruas, com apoio do FAC – Fundo de Apoio à Cultura do Distrito Federal. A entrada é franca.
A montagem é um trabalho de palhaçaria musical inédito, criado pelas artistas Karla Concá, diretora do espetáculo e precursora na palhaçaria feminina no Brasil, e Caísa Tibúrcio, que interpreta a palhaça Ananica.
Durante a apresentação, Ananica conduz uma bicicleta antiga, modelo Penny Farthing, chamada de Triluna, que se desdobra em instrumentos musicais como marimbas, pratos e buzinas. Juntas, elas planejam fazer um concerto a partir da musicalidade de Chiquinha Gonzaga.
“Abre Alas: Concerto à Doidivana” foi criado para ser apresentado na rua e também faz parte da pesquisa de doutorado de Caísa Tibúrcio sobre palhaçaria musical. A atriz, palhaça e musicista, além de ter uma pesquisa na musicalidade do teatro, é multi-instrumentista: toca acordeom, flauta, pandeiro e canta. Nas suas montagens, ela explora a utilização desses instrumentos de diversas maneiras e, para esse novo projeto, trouxe um original e inovador instrumento cênico-musical, que é a bicicleta.
Feminista numa época em que a palavra ainda nem figurava nos dicionários
O público poderá assistir a uma apresentação que trabalha com pilares da cultura popular engendrados no Brasil a partir do final do século XIX – um período de profundas mudanças sociais e que era movido pelas manifestações insurgentes das camadas populares.
Nessa época, Chiquinha Gonzaga produziu uma obra musical essencial para o que hoje chamamos de música popular brasileira.
“Mesmo sem evidências históricas que comprovem a relação direta dela com os movimentos sufragistas e de luta política das mulheres, a sua participação nesse processo é muito marcante, porque ela foi uma mulher de atitudes revolucionárias, que modificou aspectos da vida pública e privada”, destaca Caísa Tibúrcio.
Os teatros lotavam para ouvir os seus maxixes. Era a primeira vez que tocavam músicas dançantes feitas por uma compositora no teatro, que foi também a primeira a reger uma orquestra no Brasil, além de suas ações transgressoras abrirem caminho para outras mulheres artistas, o que a transformou num ícone do feminismo brasileiro.
Dentro desse contexto, o espetáculo destaca ainda o papel da bicicleta nos movimentos feministas desse período. O veículo virou símbolo da liberdade feminina, já que andar de bicicleta também significava se deslocar sem acompanhantes e com roupas mais confortáveis, como calças ao invés de saias e espartilhos. O programa do espetáculo foi criado especialmente para contar essa história.
A escolha de Karla Concá para dirigir a montagem, portanto, vem ao encontro da proposta do projeto de destacar o protagonismo feminino. Ela fundou, em 1991, o grupo Maria das Graças, que hoje funciona como associação, com a missão de valorizar a arte da mulher palhaça dentro da visão feminina e feminista.
Sua existência há 30 anos se torna também um instrumento de resistência e de promoção de mudanças nas relações sociais de gênero. O primeiro grupo de mulheres palhaças do Brasil abriu caminhos para uma profissão, até então, restrita ao universo masculino.
Memória coletiva e fortalecimento das identidades culturais brasileiras
No final do século XIX e início do século XX, houve um forte intercâmbio entre os circos e artistas circenses estrangeiros e brasileiros. A tradição do palhaço musical instrumentista europeu, conhecida principalmente pela figura do excêntrico musical, continuou no Brasil com os palhaços cantores e tocadores de violão: que mesclavam a figura do palhaço, instrumentista, cantor e ator.
Eles foram fundamentais para a divulgação da música brasileira, pois além de interpretarem as músicas cômicas como o maxixe e o lundu, também popularizaram as canções melodramáticas e sentimentais, como os choros e samba-canção, com tom de sátira e brincadeira. Ou seja, gêneros musicais trabalhados intensamente por Chiquinha Gonzaga nos teatros, no circo-teatro, nas rádios e nos cordões de carnaval.
“A partir desse contexto cultural e histórico de construção e fixação da cultura popular brasileira popular urbana, criei no campo da performatividade cômica do espetáculo. Unindo a linguagem da palhaçaria musical e a musicalidade pioneira de Chiquinha Gonzaga, o espetáculo – que antes foi um número – trabalha com a memória social. É um impulso para poetizar o que foi omitido. Olhar para o passado para reinventá-lo e ressignificá-lo. Criar e recriar a memória a partir dos novos sentidos que a atualidade propõe”, explica a artista.
Dessa forma, as canções célebres de Chiquinha, como “Abre alas”, “Corta jaca”, “Lua Branca” e “Atraente”, e outras menos conhecidas, como “Meditação”, “Argentina e “Canção do Maestro”, são referências musicais e dramatúrgicas para a pesquisa e criação desse espetáculo inédito.
De acordo com Caísa, o esquecimento histórico ainda é usado como estratégia de dominação por regimes totalitários.
“Por isso me propus a remover os escombros do passado para procurar os que precisam ser relembrados. Infelizmente, sabemos que, no Brasil, este é um assunto fundamental de debate: a busca da memória coletiva e o fortalecimento das nossas identidades culturais”, finaliza.
Vale destacar que o trabalho bebe nas fontes dos bailes dançantes da virada do século XIX para o XX, explorando os movimentos dos primórdios da dança de salão, do maxixe, a dança que já foi um dia proibida pela ousadia do movimento. Não por acaso, a apresentação de Samambaia será no mesmo dia do bailinho “Bailame com Sr. Gonzales Serenata Orquestra”.
PROGRAMAÇÃO DE APRESENTAÇÕES:
20 de agosto (sábado)
Local: Praça do Cruzeiro
Horário: 17h30
Entrada franca
LIVRE PARA TODOS OS PÚBLICOS
21 de agosto (domingo)
Local: Parque ecológico Águas Claras
Horário: 17h
Entrada franca
LIVRE PARA TODOS OS PÚBLICOS
27 de agosto (sábado)
Local: Praça Cine Itapuã
Praça 01, Setor Leste – Gama
Horário: 17h
Entrada franca
LIVRE PARA TODOS OS PÚBLICOS
28 de agosto (domingo)
Local: Complexo Cultural Samambaia
Horário: 16h
Entrada franca
LIVRE PARA TODOS OS PÚBLICOS
3 de setembro (sábado)
Local: SQN 410
Horário: 17h
Entrada franca
LIVRE PARA TODOS OS PÚBLICOS
4 de setembro (domingo)
Local: SQN 308
Horário: 17h
Entrada franca
LIVRE PARA TODOS OS PÚBLICOS
10 de setembro (sábado)
Local: Complexo Cultural Planaltina
Horário: 17h
Entrada franca
LIVRE PARA TODOS OS PÚBLICOS
Em escolas
19 de agosto (sexta-feira)
Local: CEF 04 do Paranoá
Horário: 16h30h
Fechada para alunos da escola
26 de agosto (sexta-feira)
CEF 10 da Ceilândia Norte
Horário: 16h
Fechada para alunos da escola
9 de setembro (sexta-feira)
Local: CEF Lobo Guará do Riacho Fundo II
Horário: 10h30
Fechada para alunos da escola