Médica de réu do 8/1 que morreu na Papuda, em Brasília, alertou para risco de morte na prisão
Na segunda (20), Cleriston teve um mal súbito no Complexo Penitenciário da Papuda, onde estava detido preventivamente por participar dos atos golpistas de 8/1, e veio a óbito
A médica Tania Maria Liete Antunes de Oliveira assinou dois relatórios médicos em que solicitava “agilidade na resolução do processo legal” de Cleriston Pereira da Cunha, 46, porque ele corria risco de morrer na prisão.
Na segunda (20), Cleriston teve um mal súbito no Complexo Penitenciário da Papuda, onde estava detido preventivamente por participar dos atos golpistas de 8/1, e veio a óbito.
A defesa dele alega que por diversas vezes informou o gabinete do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), sobre as condições de saúde do detento, pedindo que ele aguardasse o julgamento em liberdade ou ao menos em prisão domiciliar. Foram oito pedidos, dizem os advogados. Em vão.
O Supremo não se manifestou. Ao ser informado do óbito, Moraes determinou apuração das circunstâncias da morte e pediu informações, inclusive do prontuário médico de Cleriston.
No dia 27 de fevereiro, a reumatologista afirmou em um relatório que “em função da gravidade do quadro clínico [de Cleriston], risco de morte pela imunossupressão e infecções, solicitamos a agilidade na resolução do processo legal do paciente, até pelo risco de nova infecção por Covid que pode agravar o estado clínico do paciente”.
No documento, ela relata que Cleriston era tratado há oito meses no setor de reumatologia do Hospital Regional de Taguatinga, no Distrito Federal, “por quadro de vasculite [inflamação de vasos sanguíneos] de múltiplos vasos e miosite secundária à Covid-19”.
Diz que ele chegou a ficar internado por 33 dias em 2022 para tratar das sequelas da Covid, recebendo corticoide e antibióticos por via endovenosa.
Listou que ele tomava quatro medicações, inclusive para tratamento de síndrome vasovagal “secundária à vasculite”. E afirmou que ele tinha consultas agendadas, mas “não compareceu devido ao impedimento legal”.
Afirmou ainda que Cleriston necessitava “manter o acompanhamento médico contínuo e uso das medicações prescritas de forma correta”.
No dia 17 de julho, ela assinou um novo relatório com as mesmas informações, e repetiu o alerta: “Em função da gravidade do quadro clínico, risco de morte pela imunosupressão e infecções, solicitamos agilidade na resolução do processo legal do paciente”.
Questionada, a médica enviou uma mensagem à coluna Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, afirmando que “em respeito ao sigilo médico, à situação extremamente delicada e em respeito à família, não posso responder a essas questões”.
No protocolo em que informa a morte de Cleriston ao ministro Alexandre de Moraes, na segunda, o diretor-geral da Papuda, Tiago Felix de Sousa, envia o prontuário que lista 22 atendimentos médicos feitos no complexo prisional ao então detento.
“Juntamos todos os documentos no processo e, durante diversas oportunidades, informamos ao ministro que Cleriston tinha problemas de saúde”, afirma o advogado Bruno Azevedo. “Estamos trabalhando com a verdade, sem cunho político”, segue ele.
O advogado Ezequiel Siqueira, que representa a Associação dos Familiares e Vítimas do 8/1, diz que Alexandre de Moraes “tem que ser responsabilizado” pela morte.
“Era uma tragédia anunciada. Tem outras pessoas lá doentes, nessa mesma situação, que podem vir a óbito a qualquer momento”, afirma.
A coluna Mônica Bergamo voltou a procurar o STF, que reafirmou que não vai se manifestar.