Polícia busca mais suspeitos no AM e apura se existe mandante de crime
Restos mortais foram encontrados nessa quinta-feira (16)
Investigadores que atuam diretamente no desaparecimento do indigenista Bruno Pereira, 41, e do jornalista Dom Phillips, 57, afirmaram à Folha, sob a condição de anonimato, que as diligências reunidas até o momento não apontam para a existência de um mandante do crime.
A hipótese, porém, existe e segue sendo apurada. Polícia Federal e Polícia Civil do Amazonas trabalham para desvendar as circunstâncias do provável assassinato.
Na noite de terça-feira (14/6), o pescador Amarildo Oliveira, conhecido como Pelado, prestou um depoimento e confessou ter participado da morte do indigenista e do jornalista, segundo informação divulgada pela PF. Na oitiva, ele descreveu o local onde teria enterrado os corpos.
No começo da tarde do dia seguinte, quarta (15/6), Pelado foi levado por policiais federais para a área do crime, onde houve uma reconstituição e onde dois corpos foram encontrados. A equipe retornou da área de noite com dois corpos dentro de sacos pretos.
Bruno e Dom estavam desaparecidos desde o dia 5 de junho na região do Vale do Javari.
O avião que transporta os remanescentes humanos encontrados chegou no início da noite desta quinta (16) em Brasília. Os corpos foram encaminhados para o INC (Instituto Nacional de Criminalística) da Polícia Federal, onde vão passar por uma série de análises.
A PF prepara um esquema especial para terminar todos os processos no menor espaço de tempo possível, reforçando equipes que vão participar da tarefa, tratada como prioridade máxima.
Várias áreas de perícia criminal vão trabalhar em conjunto para realização das apurações e laudos. O prazo ainda dependerá da sequência de exames que vão ser necessários, mas o objetivo é liberar os restos mortais em até sete dias para as famílias.
Segundo informações de pessoas que estão envolvidas no caso, Pelado informou na oitiva ter atuado para esconder os cadáveres, mas apontou pelo menos outras duas pessoas como autoras do homicídio. Ele fala da utilização de armas de fogo no episódio.
A polícia ainda apura a motivação do crime. Como mostrou a Folha, investigadores que atuam no caso têm afirmado reservadamente que as evidências e provas até o momento reforçam a hipótese de que as atividades ilegais de pesca e a caça na região são o pano de fundo do caso.
Além de Pelado, um de seus irmãos também está preso na delegacia da cidade, que fica na região de tríplice fronteira do Brasil com Peru e Colômbia.
Oseney da Costa de Oliveira, o Dos Santos, é considerado suspeito de participação no crime.
As fontes ouvidas pela reportagem dizem que a confissão só foi feita por Pelado. Dos Santos disse não ter participação no assassinato. Pelado também nega que seu irmão tenha agido no caso.
Novas diligências seguem em curso por parte da Polícia Civil e da PF.
Policiais civis cumpriram uma diligência nesta quinta (16/6), que não se referia a nova prisão de suspeitos, e colheriam ainda novos depoimentos. Três irmãos de Pelado foram ouvidos. Supostos participantes citados por Pelado estão sendo procurados, mas ainda não foram encontrados.
Policiais federais também buscam formas de encontrar o barco que era utilizado por Bruno e Dom. A embarcação foi afundada com sacos de terra, segundo divulgado pela PF.
Em nota nesta quinta, a PF afirmou que não ainda foi encontrada a embarcação, “apesar de exaustivas buscas” realizadas na área indicada pelo pescador preso.
Disse também que, das amostras coletadas no barco do suspeito, já está descartada ligação desse vestígio com o jornalista britânico. Em relação ao indigenista, será preciso realizar exames complementares.
De acordo com fontes ouvidas pela reportagem, Pelado deu a entender que o crime não foi premeditado e que não houve mandante. Ele credita o assassinato ao fato de que a atividade da pesca realizada no local estava sendo atrapalhada.
A primeira diligência importante do caso ocorreu no domingo (12/6), quando os policiais recolheram materiais como uma mochila de Dom, um documento pessoal de Bruno e roupas e calçados dos dois.
Foram as primeiras evidências concretas encontradas pelas equipes de buscas, o que só foi possível a partir da indicação de indígenas que atuaram nessas buscas.
Depois, com a confissão relatada pela PF, foi possível chegar a dois corpos. Falta o barco usado pelo indigenista e pelo jornalista.
A principal suspeita investigada pela polícia, como razão para os crimes, é a existência de conflitos e atos violentos em decorrência da exploração ilegal da caça e pesca, em especial de pirarucu e tracajá.
Pelado, que explora a pesca ilegal, é apontado como um dos responsáveis por fazer ataques contra a base de fiscalização da Funai (Fundação Nacional do Índio), que é a porta de entrada para a terra indígena Vale do Javari.
As diligências colhidas até agora apontam para a ausência de um mandante, mas a hipótese não está descartada e é objeto da investigação, que segue em curso.
As investigações também têm no horizonte um suposto financiamento da atividade de pesca e caça ilegal pelo narcotráfico na região, um problema comum a praticamente toda a tríplice fronteira.
Desde os primeiros minutos do alerta do sumiço de Bruno e Dom, integrantes da vigilância indígena que monitoram o território tinham uma certeza: Amarildo Oliveira, o Pelado, e pessoas de seu entorno eram os responsáveis pelo desaparecimento.
Após dizer que a dupla uma “aventura não recomendada” pelo Vale do Javari, onde acabara assassinada por um pescador, o presidente Jair Bolsonaro (PL) desejou nesta quinta sentimentos e confortos aos familiares dos dois.
“Nossos sentimentos aos familiares e que Deus conforte o coração de todos”, escreveu ele no Twitter, respondendo a uma nota de pesar pela morte da dupla publicada pela Funai.
Essa foi a primeira declaração de Bolsonaro desde que a Polícia Federal divulgou que o pescador conhecido como Pelado confessou ter assassinado Bruno e Dom. Antes, quando comentou o caso, por diversas vezes Bolsonaro minimizou o desaparecimento dos dois no Amazonas.
O ministro da Justiça, Anderson Torres, classificou o provável assassinato como “crime cruel” e “uma maluquice”.
Por Vinícius Sassine