Mortos pela polícia em Varginha eram do baixo escalão, aponta investigação
Segundo a investigação, a cúpula do grupo, ainda não foi investigada
Nenhum dos 26 suspeitos mortos na madrugada de 31 de outubro em Varginha (MG) durante a operação policial mais letal contra o chamado “novo cangaço” fazia parte do primeiro escalão, apontam as investigações.
Segundo a investigação, a cúpula do grupo, ainda não identificada, recrutou criminosos que já participaram de assaltos e ataques às forças de segurança com o uso de fuzis e explosivos. O entendimento da polícia, porém, é que eles atuavam em funções operacionais, no segundo ou no terceiro escalão na quadrilha.
Essa conclusão é embasada no levantamento dos antecedentes criminais dos mortos e na análise de atuação das quadrilhas que cercam pequenas e médias cidades. De acordo com investigadores e especialistas ouvidos pela reportagem, os integrantes do primeiro escalão só vão ao local do crime na fase inicial de planejamento ou no dia do roubo, para coordenar os movimentos do grupo.
Em Varginha, o grupo mirava uma central de distribuição de valores do Banco do Brasil para roubar R$ 65 milhões, segundo a Polícia Civil. É o mesmo tipo de alvo do ataque no fim de agosto em Araçatuba (SP) e com o mesmo tipo de estratégia, conforme revelou o UOL. Os investigadores agora tentam identificar e prender os suspeitos de chefiar a organização criminosa.
Entre os mortos, foram identificados ao menos quatro núcleos com suspeitos por crimes que envolvem assassinatos, assaltos a mão armada, confronto com integrantes das forças de segurança e fuga da cadeia, segundo a polícia. O UOL não localizou representantes deles.
Não houve mortes entre os agentes da PM e da Polícia Rodoviária Federal que participaram da ação. Os agentes alegaram ter retirado os suspeitos baleados ainda com vida dos sítios onde estavam, informação contestada por especialistas, que cogitam a hipótese de fraude processual. Eles não descartam a possibilidade de desmonte da cena do crime e veem semelhanças com a chacina na favela do Jacarezinho, zona norte do Rio, em maio deste ano.
Obediência à hierarquia
De acordo com os investigadores, o crime foi idealizado com a participação de criminosos que estão presos atualmente – reportagem do UOL listou quem são os principais ladrões de banco do país.
“Essas quadrilhas atuam com uma rede articulada em células que não obedece a uma hierarquia criminal clássica. Conhecemos a ficha criminal de todos que morreram lá. E nenhum deles exercia papel de destaque em outras ações. Faziam parte do núcleo tático ou operacional. O líder tem mais influência. Sabe planejar, articular e se relacionar”, afirma Lucélio Ferreira Martins Faria França, tenente-coronel.
Entre os mortos, o tenente-coronel, que preside a Associação Mato-Grossense para o Fomento e Desenvolvimento da Segurança, citou a importância do papel dos irmãos goianos Isaque e Zaqueu Xavier Ribeiro pela experiência em outros roubos. Mas descartou que exercessem algum papel de comando no grupo.
“Eles são experientes e possuem ligações com crimes violentos. Já participaram de roubos a banco em Goiânia e até em ações de ‘domínio de cidades’. Mas não estavam entre as lideranças”, diz o oficial.
Também especialista em ações do “novo cangaço”, o tenente-coronel Valmor Saraiva Racorti, comandante do Batalhão de Operações Especiais de São Paulo, diz que as ações são planejadas dessa maneira para preservar chefes da quadrilha de ataques policiais.
“Eles [chefes do grupo] participam da coordenação estratégica e só agem no dia do roubo. Quando estão no meio da ação, ditam as normas. Mas também há aqueles que fazem uma coordenação à distância mesmo”, afirma.
“O material apreendido vai dar elementos para que os líderes sejam identificados. Eles só iriam chegar ao local para auxiliar no transporte das armas, do dinheiro e na fuga”, disse o tenente-coronel Marcos Paccola, da PM de Mato Grosso.
Foram apreendidos nos dois sítios cerca de 40 kg de explosivos e armas de grosso calibre –incluindo um fuzil ponto 50, com capacidade para abater até um helicóptero.
Roubo no Paraguai e planejamento com apoio de presos
De acordo com fontes ligadas ao caso, investigado pela Polícia Federal, Polícia Civil e Ministério Público e pela própria Polícia Militar de Minas Gerais, havia no grupo inclusive suspeitos de participar de outros mega-assaltos, incluindo o roubo de R$ 120 milhões a uma transportadora de valores em Ciudad Del Este, no Paraguai, em 2017.
Investigadores ainda apontam a suspeita de participação de membros do grupo em outros crimes, como o assalto ocorrido no mesmo ano a uma empresa de valores em Uberaba (MG).