Líder religioso suspeito de cometer estupro é preso no Ceará

Aposentado dopava vítimas e simulava exame para tocá-las, diz polícia

Um líder religioso foi preso em flagrante no Crato, no interior do Ceará, suspeito de dopar vítimas com remédios e bebida alcoólica e cometer estupro, abuso sexual, tortura e lesão corporal, segundo a Polícia Civil. Oito mulheres são apontadas na investigação como vítimas, entre elas três adolescentes.
A prisão de Francisco José Alexandre de Sousa, 52, responsável pelo Lar Espírita Maria de Nazaré, ocorreu no dia 10 deste mês. Ele, que é auxiliar de enfermagem aposentado, deve responder também por charlatanismo, curandeirismo e porte ilegal de arma.

A defesa dele afirma que Sousa é inocente das acusações e que ainda não teve acesso integral ao processo.

Na operação, chamada de “Santo Nome em Vão”, a Polícia Civil apreendeu materiais cirúrgicos, um revólver calibre 38, munições, quatro celulares e seis charutos.

Segundo a delegada Kamila Brito, responsável pelo caso, ele dopava as vítimas com remédios ansiolíticos e bebidas alcoólicas e cometia os estupros.

Em uma sala particular, ele simularia um exame para tocar na vagina e seios das vítimas, dizendo que fazia o toque para realizar a cura.

Ainda segundo a delegada, Sousa ameaçava as vítimas para que não contassem. A policial acredita que outras mulheres podem vir a fazer mais denúncias nos próximos dias.

Entre as vítimas está Irena (nome fictício), 31.

Ela contou à reportagem que, em 2012, convivia com dores físicas por dias seguidos, mas não sabia o que fazer. Além do enrijecimento dos nervos, sofria com desmaios recorrentes. Sem procurar ajuda médica, resolveu tratar as dores por meio do caminho espiritual, seguindo o conselho de uma amiga.

Após o apelo, começou a frequentar as reuniões semanais do Lar Espírita Maria de Nazaré em 2012.

Irena descreveu que, no início, Sousa era sutil. No entanto, após quatro anos, percebeu que a preocupação dele ia além do convívio espiritual, invadindo a privacidade dela, ao dar palpites sobre relacionamentos amorosos e tentar manipulá-la.

Sem sucesso nas pressões psicológicas, vieram as primeiras torturas físicas.

Irena afirmou ter sido foi queimada com pingos de vela, fogo e incenso em sessões que o falso líder religioso dizia serem terapêuticas, com a justificativa de que seriam necessárias para a cura, libertação e evolução.

O medo de uma represália espiritual, diz ela, tornou-se bloqueio para a possível denúncia, no primeiro momento. Segundo ela, o falso líder dizia às vítimas que, se não fizessem ou aceitassem o tratamento, maus espíritos trariam desconforto psicológico, resultando em depressão ou até suicídio.

Cada vez mais impressionada com as marcas de tortura no corpo, Irena contou que resolveu dar um basta. Com a ajuda de uma amiga, que também frequentava o centro espírita, ela passou a colher informações durante um ano até fazer a denúncia na última semana.

Após a denúncia, outras mulheres compareceram à Delegacia de Defesa da Mulher nos dias seguintes, de forma espontânea. Em um dos depoimentos, uma das vítimas diz que foi torturada durante uma semana por Francisco.

Na ocasião, após Sousa dizer incorporar a entidade “Guardião 7”, ele teria jogado água quente e, em seguida, água gelada para afastar os espíritos ruins e efetivar a “cura”. “Fragilizadas, elas não percebiam a violência a que eram submetidas”, conta a delegada.

Ele dizia ser o espírito que cometia os crimes, e não ele, ainda segundo relato das vítimas à delegada.

Mesmo depois dos relatos de outras vítimas, Irena afirmou sofrer com a descrença de pessoas próximas, ouvindo por que não havia feito a denúncia antes.

Procurado, o advogado Thiago Bezerra Tenório da Silva, que defende Sousa, disse, em nota, que, “as investigações ainda se encontram em fase inicial, estando o mesmo sob segredo de Justiça, o qual a defesa técnica ainda não teve integral acesso, até pela natureza inicial do procedimento”.

A defesa ainda afirmou que Sousa “se declara completamente inocente de todas as acusações lhe imputadas, e que irá provar sua inocência perante a Justiça e posteriormente a sociedade”.

A Federação Espírita do Ceará publicou nota após a prisão de Sousa, informando que o Lar Espírita Maria de Nazaré, envolvido na operação, não é filiado à entidade.

“A doutrina espírita atua com a caridade desinteressada sem nenhum propósito a não ser o de auxiliar os necessitados, e não pratica em suas atividades nenhum tipo de ritual e nem se utiliza de imagens, amuletos de sorte, figuras que afastam ou atraem maus espíritos, incensos, velas e tudo mais que seja material”, conclui a nota.

Por Ideíldes Guedes

 

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