Fabricantes de motorhomes lidam com aumento da demanda em meio à falta de peças
Procura por veículos para compra ou aluguel cresceu durante a pandemia
Embaixo de um motorhome, há um automóvel. Essa premissa explica o problema dos empreendedores que fabricam ou alugam esses veículos: os modelos viraram tendência em meio à pandemia de Covid-19, mas há dificuldades para atender a demanda.
A falta de componentes e a inflação dos insumos -como o aço, que acumula alta próxima a 100% entre 2020 e 2021- atrasa a produção de veículos leves e pesados. Por consequência, há aumento nos custos e demora na entrega de componentes para a montagem das casas sobre rodas.
“Tivemos dificuldade em 2020 por conta da pandemia e do atraso das importações. Algumas peças que deveriam ter chegado no primeiro semestre só desembarcaram no final do ano passado”, diz o engenheiro Júlio Lemos, que é um dos fundadores da Estrella Mobil Motorhomes.
Os problemas de montagem ocorrem em meio ao aumento da procura. Segundo os dados da Estrella Mobil, as vendas cresceram 60% na comparação entre os primeiros sete meses de 2020 e de 2021.
“Quando surgiu a pandemia, começaram a aparecer aquelas pessoas que, mesmo antes da quarentena, já pensavam em um novo formato de viajar ou que não sabiam que existia a cultura de motorhome no Brasil”, afirma Lemos. “A pandemia não foi um empurrãozinho, mas, sim, um grande pontapé para esse crescimento.”
A Vandão Motorhomes, empresa focada no aluguel, registrou crescimento da demanda em períodos cujas atividades eram mornas. Hoje a lista de espera tem 175 nomes cadastrados.
“Estamos com muita dificuldade para encontrar peças -principalmente as importadas- para montar os motorhomes que alugamos, e os veículos zero-quilômetro aumentaram bastante”, diz Aline Frediani, diretora de marketing da empresa.
O aluguel de um motorhome é calculado com base no número de diárias e na quilometragem rodada. Viajar com um veículo para seis adultos por sete dias (média de 2.500 quilômetros) custa R$ 7.927 na Vandão, com taxas de seguro e limpeza inclusas.
Os problemas de fornecimento afetam os planos futuros. Segundo Aline, a empresa pretende substituir os veículos com mais de três anos de uso até o fim de 2022, mas a escassez de componentes tende a perdurar.
Ao mesmo tempo, é preciso fazer um planejamento que considere mudanças no mercado de motorhomes.
“Acreditamos que, com a regularização das atividades [após as restrições da pandemia], a demanda será menor no próximo ano, a tendência da procura é diminuir”, afirma Aline.
Segundo a Estrella Mobil, o perfil do público mudou com a Covid-19. Em 2018, 80% dos compradores eram aposentados e profissionais liberais. Apenas 20% das vendas eram direcionadas a um cliente com idade até a faixa dos 40 anos.
Com a Covid-19, houve aumento do interesse pelos veículos entre pessoas mais jovens, e as vendas nesse segmento passaram dos 20% para 35% do total.
O aumento do preço das vans que servem de base para a maior parte dos motorhomes tem pressionado os construtores. Hoje um furgão Renault Master é comercializado por a partir de R$ 206,8 mil.Em janeiro de 2020, o preço sugerido era de R$ 115 mil.
Segundo a Estrella, um motorhome para quatro adultos custa, em média, R$ 380 mil. Trata-se de um veículo com valor elevado, mas a procura segue alta.
“Estamos ampliando a fábrica para nos adequar à demanda. Hoje nosso prazo de fabricação varia de quatro meses para veículos menores e até 12 meses para os caminhões de expedição”, diz Lemos, que espera crescer 20% em 2022 na comparação com 2021.
Oskar Kedor, fundador da startup Mobility S/A, participou de fóruns que discutiram o futuro do turismo e da mobilidade. Os cenários traçados ao longo de 2020 mostravam que o mercado de viagens corporativas seria o último a se recuperar, enquanto o segmento de motorhomes passaria pela maior expansão.
“Estamos com uma demanda reprimida também nos EUA e na Europa. Quem produz está inflacionando o mercado, tem fila de esperada”, diz Oskar. O empresário explica que o motorhome se tornou prioridade para pessoas que adiavam o sonho de fazer uma longa viagem em família.
Ele compara os modelos mais luxuosos com os iates, que têm marinas com estrutura para receber viajantes de alta renda. Esse é um público que começa a se formar, interessado em modelos que custam R$ 700 mil.
Apesar das dificuldades, o empresário vê surgir oportunidades no setor de turismo em meio à pandemia.
“Temos profissionais que, por exemplo, fazem viagens a destinos próximos e ali conciliam o seu home office com momentos de lazer”, diz Oskar.
“Mais do que fechar pacotes tendo em vista apenas os períodos de férias, o agente de viagem passa a ser um consultor para oferecer as opções que melhor atendam às necessidades e experiências desejadas pelo cliente em suas demandas de mobilidade.”
Por Eduardo Sodré