Entenda a discussão do marco temporal

Entenda, em cinco pontos, o que significa o marco temporal e o que torna o tema importante.

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O STF (Supremo Tribunal Federal) deve retomar nesta quarta-feira (30) o julgamento sobre o marco temporal.
Entenda, em cinco pontos, o que significa o marco temporal e o que torna o tema importante.

O QUE É O MARCO TEMPORAL?

A ideia de marco temporal não existe na Constituição brasileira.

De toda forma, trata-se de uma tese jurídica, segundo a qual, a demarcação dos territórios indígenas deve seguir a área ocupada pelos povos até a promulgação da Constituição Federal, em outubro de 1988.

A Constituição reconhece aos indígenas a organização social, costumes, línguas, crenças e tradições e os direitos originários sobre “terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”.

Segundo a Constituição, “são terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”.

As terras em questão são inalienáveis e indisponíveis, ou seja, não podem ser vendidas ou cedidas, e os direitos sobre elas são imprescritíveis, o que significa que eles não caducam ou prescrevem.

COMO ESTÁ O JULGAMENTO NO STF

O voto mais recente foi o do ministro Alexandre de Moraes, que decidiu contra a criação de um marco temporal. O seu voto, porém, propôs mudanças em relação à indenização a ser paga pela União a proprietários de terras ocupadas tradicionalmente por indígenas. Tal ideia agrada ruralistas e é criticado por indígenas.

O julgamento será retomado com o voto do ministro André Mendonça, que havia pedido vista. O ministro representou o governo Jair Bolsonaro no processo do marco temporal, que está em julgamento na Corte, quando chefiava a AGU (Advocacia-Geral da União). Nos autos, ele defendeu a tese.

Com início em 2021, o processo tem como relator o ministro Edson Fachin, que foi o primeiro a votar e refutou a tese do marco temporal. Segundo ele, a teoria desconsidera a classificação dos direitos indígenas como fundamentais, ou seja, cláusulas pétreas que não podem ser suprimidas por emendas à Constituição.

Para Fachin, a proteção constitucional aos “direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam” não depende da existência de um marco.

O ministro Kassio Nunes Marques defendeu a tese do marco temporal.

A ação do marco temporal é de repercussão geral, o que significa que todos os processos similares sobre o tema devem seguir a tese adotada pelo Supremo no julgamento atual.

O QUE DIZ O PROJETO NO CONGRESSO?

O texto foi aprovado na Câmara por 283 a 155. Deputados rejeitaram destaques que poderiam amenizar a proposta, que, agora, aguarda análise pelo Senado.

O projeto é criticado por ambientalistas, que afirmam que o texto dificulta a demarcação de terras indígenas. A bancada ruralista defende o texto e diz que a proposta dá segurança jurídica ao agronegócio.

O texto defendido pela bancada ruralista e aprovado na Câmara diz que “é nula a demarcação que não atenda aos preceitos estabelecidos nesta lei”. O trecho é criticado por indígenas ao abrir espaço para que áreas já homologadas sejam anuladas, o que pode causar a expulsão de povos de seus territórios e aumenta o risco de conflito.

Além disso, o texto abre brecha para que terras demarcadas sejam retomadas pela União, “em razão da alteração dos traços culturais da comunidade ou por outros fatores ocasionados pelo decurso do tempo”.

Avançando no Senado, o texto cria dispositivos que flexibilizam a exploração de recursos naturais e a realização de empreendimentos dentro de terras indígenas.
Originalmente, o texto não tratava da tese, mas transferia para o Poder Legislativo a prerrogativa de demarcação dos territórios.

O QUE DIZEM OS QUE SÃO CONTRA O MARCO TEMPORAL?

Em primeiro lugar, na Constituição brasileira consta o direito aos territórios tradicionalmente ocupados, sem menções a datas. Indígenas defendem que se trata de um direito reconhecido, não concedido pela Constituição. Trata-se, dizem, de um direito originário, anterior ao próprio Estado brasileiro.

Além disso, o direito dos indígenas a suas próprias terras já constava na Constituição de 1934 e em legislações do período colonial, como em um alvará de 1680.

Há temor de que, caso seja reconhecido, o marco temporal acabe por incentivar mais desmatamento e grilagem -como forma de tentar comprovar, com fraude, a ocupação de uma área- dentro de terras indígenas por parte de proprietários rurais.

Teme-se que o reconhecimento do marco também leve à insegurança fundiária e, consequentemente, agravamento de conflitos e violência no campo.

O QUE DIZEM OS QUE SÃO A FAVOR DO MARCO TEMPORAL?

Pode-se dizer que o principal argumento de quem é favorável ao marco é a definição de uma data clara para a ocupação de terras por indígenas. Segundo quem defende isso, tal determinação supostamente serviria para resolver disputas por terra e dar segurança jurídica e econômica.

Há ainda uma leitura extremista sobre a questão da data, que ironicamente foi apelidada de “tese de Copacabana”. A ideia, levantada pelo ministro Gilmar Mendes na anulação da demarcação da terra indígena Guyraroká, em 2014, diz que todo o Brasil poderia ser reivindicado como terra indígena, incluindo grandes centros urbanos, o que geraria um problema de insegurança sobre a propriedade de imóveis.

Vale mencionar que o absurdo da afirmação se dá devido a todos os requisitos necessários para a demarcação de um território indígena.
A “tese de Copabacana” já foi usada como argumento pela FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária) para se posicionar a favor da criação de um marco temporal.

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