Dono de escola preso nega tortura e diz ser ‘brincadeira’ criança amarrada em pilar, afirma defesa
Homem e sua companheira tiveram a prisão temporária de 30 dias decretada pela Justiça depois que vídeos e fotos registraram crianças amarradas e suspeitas de maus-tratos
A defesa dos donos de uma escola no Jardim da Glória, zona sul de São Paulo, afirma que seus clientes negam ter agido com violência contra as crianças. O casal foi preso nesta terça (27) por suspeita de tortura, maus-tratos e submeter alunos a situação vexatória.
“Eles não enxergam os atos ali praticados como tortura. Eles afirmam que nunca tiveram essa intenção. Nunca foi esse o fundamento da situação”, disse a advogada Sandra Pinheiro de Freitas em conversa com a Folha.
Freitas relatou que foi procurada por Eduardo Mori Kawano e Andrea Carvalho Alves Moreira por volta das 22h de terça. Ela assumiu a defesa deles após a desistência da advogada anterior.
Os dois, que ainda não foram ouvidos pela polícia, devem cumprir prisão temporária de 30 dias.
“Eles afirmam, principalmente o Eduardo, que ele não via os atos dele como violência, como tortura, como está sendo colocado tanto no processo quanto pela mídia”, explicou Freitas.
Uma das imagens divulgadas pela polícia mostra um menino com as mangas da blusa amarradas no que se parece com um pilar.
“Ele me relatou que aquele negócio de amarrar as crianças ele via como uma brincadeira. Ele brincava assim quando era criança. O grande problema também é como foi colocada cada foto. Como foi colocado cada vídeo. Tudo isso vai ter que ser analisado no processo.”
Para a advogada, é recomendada uma apuração mais aprofundada do caso, porque, nas palavras dela, não se sabe se existia uma brincadeira anterior e, somente depois, a criança começou a chorar.
“A tortura em si, ela tem um contexto muito complementar. Você precisa ter um ideal muito forte para você praticar a tortura. A tortura, ela não se faz por si só. Ela tem que ter todo um contexto de redução, de humilhação, ela tem que ter toda uma história por trás”.
O casal chegou a ser considerado foragido e, segundo o delegado Fábio Daré, titular do 6° DP (Cambuci), os dois se entregaram após uma negociação.
Freitas afirmou que seus clientes decidiram se apresentar por medo.
“Eles estão muito abalados com o que aconteceu. Na verdade, eles acabaram se entregando porque eles foram ameaçados”.
A advogada afirmou que ambos temem ser atacados por outros presos na cadeia, já que respondem a crime envolvendo criança. Enquanto durar a temporária, eles devem ficar em carceragens separadas. Ele, no 8° DP (Brás). Ela, no 6° DP (Cambuci).
O CASO
O delegado Daré afirma que soube no último dia 19 de um boletim de ocorrência contra os proprietários. Desde então, foram ouvidas duas funcionárias e 12 mães —de alunos com idade de 1 ano e 8 meses a 6 anos.
De acordo com a polícia, as mulheres que lidavam com os alunos afirmaram que discordavam das atitudes dos donos da escola e que não chegaram a receber salário.
Ainda segundo o delegado, há indícios de violência psicológica contra as crianças.
“Colocar uma criança de 1 ano e 8 meses dentro de um quarto escuro por horas. Colocar uma criança com incontinência urinária sentada num balde para urinar e defecar ali, para não sujar a escola. Colocar essa mesma criança num ralo para fazer as necessidades pessoais dela. Amarrar uma criança num pilar. Esses elementos me levaram a crer que houve tortura na escola”, disse Daré na sexta.
“As oitivas delas foram muito concatenadas, uma bateu com a outra”, acrescentou.
Suspeita-se que apenas os donos do colégio agrediram as crianças, segundo o delegado. Não há indícios, de acordo com ele, da participação de professores.
Uma ex-funcionária, que trabalhou na escola em 2016, procurou a delegacia após a repercussão do caso e relatou ter presenciado situações de maus-tratos enquanto esteve na unidade.
Por Paulo Eduardo Dias