Brasil vai barrar viajantes de 6 países da África, e governo ignora passaporte da vacina
A ideia é evitar que se espalhe no Brasil uma nova variante
O governo Jair Bolsonaro decidiu nesta sexta-feira (26) proibir a entrada no Brasil de quem esteve, nos últimos 14 dias, em seis países africanos: África do Sul, Botsuana, Suazilândia (Eswatini), Lesoto, Namíbia e Zimbábue.
A ideia é evitar que se espalhe no Brasil uma nova variante da Covid-19 potencialmente mais transmissível, a B.1.1.529, batizada de ômicron pela OMS (Organização Mundial da Saúde).
Segundo o ministro Ciro Nogueira (Casa Civil), a portaria com a medida será publicada neste sábado (27) e passará a valer a partir de segunda-feira (29).
“O Brasil fechará as fronteiras aéreas para seis países da África em virtude da nova variante do coronavírus. Vamos resguardar os brasileiros nessa nova fase da pandemia”, escreveu, no Twitter.
A decisão contrasta com as falas de Bolsonaro ao longo desta sexta. Mais cedo, a apoiadores na frente do Palácio da Alvorada, em Brasília, Bolsonaro disse que uma nova onda do coronavírus está a caminho, mas havia descartado fechamento de fronteiras aéreas.
Para o presidente, seria ineficaz impedir a chegada de voos internacionais e repetiu que é preciso conviver com a Covid. “Você não vai vedar [a entrada do vírus], rapaz. Que loucura é essa? Quer dizer, fechou o aeroporto, o vírus não entra? O vírus já está aqui dentro”, disse o o presidente.
Já no Rio de Janeiro, mais tarde, Bolsonaro defendeu a adoção de “medidas racionais” para conter a chegada da variante ômicron. Ele descartou um novo lockdown, além de fechamento de fronteiras.
“O Brasil não aguenta mais um lockdown. Conversei com o almirante Barra Torres [presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária], com o Ciro, da Casa Civil, discutindo Argentina. Quem vem da Argentina de carro para cá, sem problemas. Quem vier de avião tem de ficar quatro dias em quarentena. Vamos tomar medidas racionais”, disse ele.
As novas restrições divulgadas horas depois já haviam sido propostas, mais cedo, pela Anvisa, que também defende a exigência do certificado de vacinação da Covid-19 a quem entra no Brasil pela fronteira terrestre e por voos internacionais.
O governo, contudo, não deliberou a respeito deste pedido da agência reguladora na reunião desta sexta no Palácio do Planalto.
De acordo com interlocutores da Saúde e do Planalto, que estiveram no encontro, o assunto deve ser discutido na próxima semana, mas admitem ser improvável que seja atendido o pedido do órgão regulador.
A reunião foi convocada em caráter emergencial, por causa da nova cepa, e dela participaram apenas as equipes técnicas. Os ministros Ciro Nogueira (Casa Civil), que fez o anúncio, Marcelo Queiroga (Saúde) e Anderson Torres (Justiça), que assinam juntos a portaria, não participaram do encontro.
O pedido de estabelecer o “passaporte da vacina” foi apresentado pela Anvisa no dia 12 ao Palácio do Planalto, como revelou a Folha, mas esbarra nas bandeiras negacionistas de Bolsonaro e de seus aliados. O presidente já disse publicamente que não se vacinou ainda.
Na nota parar defender o veto a viajantes, a Anvisa disse que não há voos procedentes diretos destes seis países, então a medida deve impactar quem fez escala na região nos 14 dias anteriores à viagem ao Brasil.
O governo também determinou que passageiros que se enquadram em exceções na portaria de restrições de fronteiras, como membros do corpo diplomático, devem fazer quarentena ao desembarcar no Brasil, caso tenham passado pelos países com registro da ômicron.
Em nota técnica, a Anvisa afirma que países como Itália, Alemanha e Reino Unido já adotaram medidas de restrição de trânsito de viajantes de regiões com registro da nova variante.
A OMS classificou a nova cepa como “variante de preocupação”, por causa do potencial risco de ser mais transmissível que as anteriores. Mesmo antes dessa avaliação, o grande número de mutações da variante gerou uma grande onda de atenção em vários países do mundo.
Ainda é cedo para ter evidências científicas de seus efeitos sobre o contágio, a gravidade da doença ou a eficácia da vacina, mas governos preferiram se antecipar enquanto forças-tarefa de cientistas trabalham “24 horas por dia” para entendê-la.
O Ministério da Saúde emitiu um alerta para as secretarias estaduais sobre a nova variante. Segundo o documento, até esta sexta ainda não foi identificado nenhum caso de Covid no Brasil causado por essa cepa.
O documento da pasta foi direcionado para a rede CIEVS (Centro de Informações Estratégicas de Vigilância em Saúde), que reúne o sistema de vigilância do país.
O texto orienta que as redes façam a notificação imediatamente para a pasta quando houver casos suspeitos ou confirmados da nova variante.
Em casos suspeitos de viajantes oriundos de países com a circulação da cepa, a pessoa deve ser monitorada por 14 dias quando apresentar sintomas da doença e por sete dias caso esteja assintomática.
Por Mateus Vargas, Marianna Holanda e Raquel Lopes