Alta da conta de luz afeta pacientes dependentes de aparelhos elétricos

Na última sexta (1º), o governo voltou a permitir o corte de luz de mais pobres por falta de pagamento

O aumento da conta de luz das residências afeta pacientes que dependem de aparelhos médicos ligados à energia elétrica. É o caso de Fabrícia Nascimento, 14, de Brasília, que por dez horas por dia faz diálise peritoneal, procedimento de substituição renal feito em casa com equipamento elétrico.

Com as novas bandeiras tarifárias, a fatura de energia ficou pesada para a família, ainda que seja beneficiária da Tarifa Social de Energia Elétrica. Na última sexta (1º), o governo voltou a permitir o corte de luz de mais pobres por falta de pagamento.

Entre setembro de 2020 e o mês passado, a alta acumulada da energia elétrica foi de 25,26%, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Diana de Oliveira, mãe de Fabrícia, relata que antes da pandemia a conta de luz era acessível, em torno de R$ 20. Hoje, mesmo com o desconto, fica cerca de R$ 80, um valor insustentável para a sua renda.

“Faz dois meses que a conta está muito pesada. No último mês eu não consegui pagar a luz nem a água, só o aluguel. Fora que eu tenho que arcar com os medicamentos que o posto não fornece”, diz Oliveira, que é manicure e sustenta sozinha três filhos.

O BPC (Benefício de Prestação Continuada) e o Bolsa Família não são suficientes para cobrir todos os gastos com a saúde da adolescente, explica a mãe. Para conseguir dar conta, ela passou a trabalhar mais.

A Tarifa Social de Energia Elétrica concede descontos para os consumidores de baixa renda. Para famílias que têm um membro que requeira o uso contínuo de aparelhos elétricos, a renda deve ser de até três salários mínimos, como é a situação de Oliveira.

Também têm direito aos descontos as famílias com renda per capita menor ou igual a meio salário mínimo, e os idosos com 65 anos ou mais ou pessoas com deficiência que recebem o BPC. Alguns estados oferecem outros benefícios, como o Programa Luz Fraterna, no Paraná.

Em todo o Brasil, apenas 10.333 famílias com pacientes eletrodependentes são beneficiárias da tarifa, informa a Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica). Só em diálise peritoneal no país são 2.981 pessoas, segundo a Sociedade Brasileira de Nefrologia. Porém, o benefício abrange outros casos, como o uso de concentrador de oxigênio e ventilador pulmonar mecânico, entre outros.

Antônia Fernandes tem hipertensão pulmonar e usa o CPAP, aparelho para apneia do sono, por oito horas, todos os dias. Ela conta que 20% da sua renda familiar é comprometida com a luz. Outros 25% são destinados à compra de remédios. No entanto, a família de três pessoas não atende o limite de renda da tarifa social.

Fernandes, que mora em Jacundá, no Pará, viu a sua conta de luz saltar de R$ 800 em maio para R$ 1.222 em setembro. “Quando a energia aumenta, o salário não cresce na mesma proporção. Então, eu tenho um déficit em outra área, na medicação, na alimentação.”

Para tentar controlar o gasto, ela relata que todos os seus eletrodomésticos só ficam ligados à noite. Fernandes, que é pastora, ainda recebe ajuda de amigos da igreja para o tratamento, como é o caso do seu plano de saúde, pago por uma dessas pessoas.

Desde 1º de setembro até abril de 2022, está vigente a bandeira tarifária de Escassez Hídrica, que acrescenta R$ 14,20 a cada 100 kWh consumidos. Além do aumento nacional, no Pará Fernandes paga a quarta tarifa mais cara do país, segundo ranking da Aneel.

O custo também é mais alto para quem usa muitos aparelhos eletromédicos. Gabriel Caetano Souza, de oito meses, de Curitiba, nasceu com uma cardiopatia congênita e teve complicações pulmonares após a cirurgia de correção.

Enquanto ele não consegue respirar sozinho, necessita de aspirador de secreções, bomba de infusão, concentrador de oxigênio, respirador e oxímetro –os três últimos ficam ligados 24 horas. Ainda, dois no-breaks ficam conectados para alimentar os aparelhos no caso de uma queda de energia.

Desde que o menino passou a fazer o tratamento domiciliar, a conta de luz aumentou em cerca de 400%, calcula a mãe, Queren Hapuque Souza. Em agosto, quando Gabriel só passou 20 dias em casa, a fatura –que costumava ser de cerca de R$ 10– foi de R$ 465.

Todos os custos do tratamento já são muito pesados, diz Souza. Ela está tentando a tarifa social, mas não se enquadra no requisito da renda. Se ela não conseguir, entrará na Justiça: “No caso de equipamento vital, não tinha que ter limite de renda. O artigo 196 da Constituição coloca que é dever do Estado fornecer saúde para qualquer cidadão”.

O projeto de lei nº 2.428 de 2019 e seus apensados, em tramitação na Câmara dos Deputados, preveem ampliar o direito à tarifa social a todos que necessitam do uso contínuo de aparelhos eletromédicos.

Como conseguir a Tarifa Social de Energia Elétrica

A família deve estar inscrita no CadÚnico ou no Cadastro do BPC, e a atualização cadastral deve ter no máximo dois anos Um dos integrantes da família deve solicitar à distribuidora de energia elétrica a classificação do domicílio de baixa renda Confira quais dados devem ser fornecidos aqui. Mais informações podem ser obtidas com a Aneel, pelo telefone 167.

Por Jessica Brasil Skroch

 

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